Entre aportes milionários e lucros acima do previsto, município de Campo Grande ainda é assombrado por um fantasma de reajuste duplo em ano eleitoral
Evento na manhã desta quarta-feira (15), no terminal de ônibus General Osório em Campo Grande, a assinatura de uma ordem de serviço de reforma com a presença da prefeita Adriane Lopes, ao lado do diretor-presidente do Consórcio Guaicurus, João Rezende, mostra que as duas partes selaram as pazes após a “guerra” que travaram judicialmente.
Essa ordem de Serviço, para o início das reformas dos terminais de transbordo do General Osório e Nova Bahia, vem à tona duas semanas após o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS) decidir que a Prefeitura de Campo Grande deverá realizar os reajustes do transporte coletivo sempre em outubro.
Também, essa “paz” entre as partes acontece cerca de um mês após troca de comando da Agência Municipal de Transporte e Trânsito (Agetran), quando o engenheiro civil, Janine de Lima Bruno, deixou a pasta após sete anos, para entrada do ex-dono de autoescola, Paulo Silva.
Desde essa troca de cadeiras, mudanças passaram a pipocar na relação entre as partes, como o aumento de R$ 3,3 milhões na chamada “subvenção econômica”está em suspensão do contrato com o Consórcio CAM, que há mais de seis anos comandava a prestação de “serviços técnicos de manutenção da sinalização semafórica, horizontal, vertical e dispositivos auxiliares”.
Recebendo a ordem de reforma “com muita alegria”, na manhã de hoje (15), João Rezende fez questão de indicar que dentro de 33 anos de operação, essa intervenção será mais “expressiva”, citando a reforma dos banheiros que, segundo ele, constantemente são alvo de vandalismo, além das pinturas das plataformas que, no caso, estão melhor conservadas.
“Guerra Judicial”
Em abril de 2023 houve aumento de 12 para R$ 15,6 milhões ao ano no dinheiro repassado pela Prefeitura ao Consórcio Guaicuruspela gratuidade dos alunos da Rede Municipal de Ensino (REME), projeto do próprio Executivo aprovado pela Câmara Municipal.
Cerca de um mês depois, os próprios parlamentares acionaram à Justiça por ação popularcom uma série de alvos que deveriam provar – por relatórios e documentos – se o contrato de concessão do transporte público coletivo estava sendo devidamente cumprido.
Na ação, ingressada pelos vereadores Marcos Tabosa (PDT) e Professor André Luís (Rede), as demandas miraram:
- Prefeita de Campo Grande, Adriane Lopes,
- Diretor-presidente da Agência Municipal de Regulação de Serviços Públicos (Agereg), Odilon de Oliveira Junior.
- Diretor-presidente da Agência Municipal de Transporte e Trânsito (Agetran), à época na pessoa de Janine de Lima Bruno
- E o diretor-presidente do Consórcio Guaicurus, João Resende Filho,
Ó Ministério Público de Mato Grosso do Sul alegou na Justiça que a licitação que concedeu o transporte teria sido fraudada “para beneficiar quatro das cinco empresas que à época exploravam o serviço e que acabaram vencendo a disputa”, como abordou o Correio do Estado na data.
Em resposta, o juiz Ariovaldo Nantes Corrêa, da 1ª Vara de Direitos Difusos e Individuais Homogêneos de Campo Grande, indeferiu o pedido do MPMS, mantendo a licitação como válida e, consequentemente, o contrato derivado dela também.
Desde que uma operação batizada como “Riquixá” apontou, em 2017 pelos Ministério Públicos de MS e do Paraná, a suposta atuação de organização criminosa que ilegalmente direcionava concorrências públicas entre empresários e prefeituras.
A partir daí houve decisões e suspensões ligadas à data-base para o reajuste, com o Executivo Municipal sinalizando o mês de março como ideal, enquanto o consórcio apontava para outubro, conforme contratado inicialmente entre as partes.
Os empresários solicitaram então perícia judicial, que a conclusão mostrou o contrário do que eles previamque entre 2012 e 2019 o Consórcio acumulou lucro de 78,5% acima do previsto.
Nesse meio tempo o Consórcio somou uma desoneração da folha de pagamentos em agosto de 2023, para cobrar logo no início de 2024 a diferença de R$ 1,20 no preço entre as tarifas técnica e pública, alegando o descumprimento do Município desde dezembro do ano passado com pedido de multa diária de R$ 100 mil
Ao fim de 2023, esse cabo de guerra com relação à data-base se intensificou, com Odilon frisando a lei 10.192 (de 14 de fevereiro de 2001), que prevê impedimento de reajustes em prazo menor de 12 meses.
Ainda, como bem detalhado pelo Correio do Estado, entre janeiro e outubro de 2023 o Consórcio as passagens renderam R$ 116.125.289,00, conforme dados da Agereg, com dados obtidos por Lei de Acesso à Informação indicando faturamento médio de R$ 11,5 milhões por mês apenas com passagens de ônibus.
Com a mais recente decisão do TJMS, para que a Prefeitura da Capital cumpra os reajustes do transporte coletivo sempre em outubro, e diante do aumento de 10 centavos ainda em março – que jogou a tarifa pública de R$ 4,65 para R$ 4,75o fantasma do reajuste duplo voltou a assombrar o campo-grandense.
Em março de 2024, durante agenda na Casa da Mulher Brasileira, em abordagem à equipe do Correio do Estado – às vésperas do aumento tarifário – a prefeita municipal de Campo Grande, Adriane Lopes (PP), garantiu que não iriam “onerar duplamente a população” neste ano eleitoral.