O empresário e apresentador Silvio Santos, falecido neste sábado (17) aos 93 anos, fez uma tentativa notável de concorrer à presidência da República em 1989, na primeira eleição direta para o cargo desde o fim da ditadura militar no Brasil. Representando o extinto Partido Municipalista Brasileiro (PMB), sua candidatura foi barrada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) poucos dias antes do primeiro turno, em um episódio que agitou o cenário político daquela época.
Silvio Santos, amplamente reconhecido por seu papel na televisão brasileira e como fundador do Sistema Brasileiro de Televisão (SBT), iniciou sua carreira na comunicação em 1963 com o Programa Silvio Santos. Sua incursão na política ocorreu em um momento de intensa renovação democrática no Brasil, que, após quase três décadas de regime militar, voltou a permitir a escolha direta do presidente da República. A candidatura do empresário foi oficializada apenas duas semanas antes da eleição, mas logo enfrentou uma série de contestações que levariam ao seu indeferimento pelo TSE em 9 de novembro de 1989, seis dias antes do pleito.
O impacto e a repercussão da candidatura
Embora sua candidatura tenha durado pouco, ela teve um impacto significativo no processo eleitoral daquele ano. Pesquisas indicavam que Silvio Santos tinha cerca de 30% das intenções de voto, um número expressivo que o colocava entre os favoritos, mesmo com a campanha sendo conduzida em um período muito curto. A popularidade do apresentador de TV foi um fator que preocupou seus adversários políticos, que rapidamente articularam medidas legais para impugnar sua candidatura.
A principal justificativa para o indeferimento foi a irregularidade no registro do PMB, partido pelo qual Silvio Santos se candidatou. Além disso, o TSE levou em conta as restrições legais que envolviam a candidatura de proprietários de emissoras de televisão, uma vez que Silvio Santos mantinha o controle do SBT, mesmo que formalmente não estivesse no comando direto da emissora. Essas questões levantaram dúvidas sobre a legalidade de sua participação na disputa, resultando em uma decisão unânime da corte eleitoral, que frustrou os planos do empresário e de seus apoiadores.
O contexto da eleição de 1989
A eleição de 1989 foi marcada por uma atmosfera de efervescência política, com o país recém-saído de um regime ditatorial e vivenciando as primeiras eleições presidenciais diretas em quase três décadas. Desde a vitória de Jânio Quadros em 1960, os brasileiros não tinham a oportunidade de escolher diretamente seu presidente. O ambiente político foi moldado por uma pluralidade de candidatos, com mais de 20 nomes lançados na disputa pelo Palácio do Planalto.
Entre os principais candidatos estavam figuras de destaque como Ulysses Guimarães (PMDB), Lula (PT), Leonel Brizola (PDT) e Fernando Collor (PRN). Collor, lançado pelo nanico PRN, destacou-se com uma imagem de político jovem e independente, enquanto Lula, líder sindical e fundador do PT, apresentava-se como o principal adversário do candidato do PRN. Nesse cenário de intensa disputa, a entrada de Silvio Santos na corrida presidencial foi vista como um elemento surpresa que poderia alterar o equilíbrio das forças políticas.
A oficialização da candidatura e a curta campanha
A candidatura de Silvio Santos foi oficializada no dia 31 de outubro de 1989, apenas duas semanas antes do primeiro turno, após uma brecha na legislação eleitoral que permitiu ao PMB lançar o apresentador como seu candidato. Antes de chegar a esse acordo, Silvio Santos havia negociado com o PFL, que tinha Aureliano Chaves como candidato, mas as conversas não avançaram, levando o empresário a optar por um partido de menor expressão.
O PMB, até então, tinha como candidato o pastor Armando Corrêa, que desistiu da disputa para dar lugar a Silvio Santos. Marcondes Gadelha, senador pela Paraíba, foi escolhido como candidato a vice-presidente na chapa. Com a oficialização tardia, Silvio Santos teve pouco tempo para se engajar na campanha, realizando apenas 10 dias de propaganda eleitoral.
Durante esse período, as aparições de Silvio Santos na televisão focaram em apresentar seu programa de governo, que priorizava áreas como alimentação, saúde, habitação e educação. Em uma de suas propagandas, ele prometeu atacar “imediatamente” a inflação e a falta de correção do salário mínimo. Outro destaque foi o jingle de sua campanha, que utilizava a melodia famosa de seus programas de auditório, com o refrão “É o 26! É o 26! Com o Silvio Santos, chegou a nossa vez”.
No entanto, um dos maiores desafios enfrentados pelo apresentador foi o fato de seu nome não constar nas cédulas de votação, uma consequência da troca de candidatos feita às pressas pelo PMB. Em suas inserções na TV, Silvio Santos orientava os eleitores a votarem no número 26, associado ao nome de Armando Corrêa, que havia renunciado à candidatura. A eleição de 1989, vale lembrar, ainda era realizada por meio de cédulas impressas, já que as urnas eletrônicas só seriam implementadas a partir das eleições municipais de 1996.
As impugnações e a decisão do TSE
A popularidade de Silvio Santos gerou uma onda de contestações por parte de seus adversários. Segundo dados do portal do TSE, foram apresentadas 18 impugnações contra sua candidatura, com a principal delas sendo articulada pelo PRN, partido de Fernando Collor, e liderada por Eduardo Cunha, que mais tarde se tornaria deputado e presidente da Câmara dos Deputados.
As impugnações alegavam, entre outros pontos, que o PMB não havia cumprido as exigências legais para o registro de candidaturas, como a realização de convenções regionais e municipais em um número mínimo de estados e cidades. Além disso, a vinculação de Silvio Santos ao SBT, uma emissora de televisão concessionária de serviço público, também foi um fator decisivo para o indeferimento.
No dia 9 de novembro de 1989, o TSE julgou as impugnações e, por unanimidade, decidiu indeferir a candidatura de Silvio Santos, declarando extintos os efeitos do registro provisório do PMB. A corte eleitoral acatou o parecer da Procuradoria-Geral Eleitoral, que apontava a inelegibilidade de Silvio Santos com base em sua ligação com o SBT. Mesmo não constando formalmente como diretor da emissora, a Justiça entendeu que ele exercia poder sobre a empresa, o que violava a legislação eleitoral.
Com a candidatura barrada, Silvio Santos se afastou da política e voltou a focar em suas atividades como apresentador e empresário. O episódio de sua breve candidatura à presidência ficou registrado como um dos momentos mais inusitados da história eleitoral brasileira, destacando a complexidade e a volatilidade do processo democrático no período pós-ditadura.
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