Integrantes do governo Lula (PT) criticaram nesta terça-feira (22) no STF (Supremo Tribunal Federal) uma lei do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos) que instituiu o modelo de escolas cívico-militares. A corte faz uma audiência pública no âmbito de duas ações que questionam o formato, instituído pela legislação paulista.
De acordo com o MEC (Ministério da Educação), a educação defendida pela pasta é baseada no pluralismo de ideias e de espaço de formação democrática e contrária a princípios como disciplina rígida e hierarquia.
O tema é debatido em audiência convocada pelo ministro Gilmar Mendes, relator das duas ações. Uma série de polêmicas tem ocorrido nas escolas desde que o governo Tarcísio abriu o processo para a seleção das unidades que serão pioneiras na implantação.
Assim que a lei foi sancionada por Tarcísio, o PSOL ingressou com uma ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade). Além desta, há outra ação impetrada pelo PT. Entre outros argumentos, as legendas argumentam que o programa estabelece “verdadeiro projeto de militarização da escola civil”, desvirtua as atribuições previstas constitucionalmente para a
Polícia Militar e afronta a gestão democrática do ensino público.
“Não há evidências de que podem ser resolvidos com a imposição de um modelo de gestão militarizado, que se baseia em princípios como disciplina rígida e hierarquia, que, muitas vezes, não dialogam com a realidade democrática e inclusiva que deve nortear a escola pública do ensino civil do Brasil”, disse Rodolfo Cabral, consultor jurídico do MEC.
Cabral também afirmou que o modelo de escolas cívico-militares, no âmbito da União, mostrou-se vulnerável do ponto de vista jurídico, sem evidências de resultados de melhoria de qualidade, e insustentável do ponto de vista econômico-financeiro.
De acordo com ele, a execução dos recursos de assistência financeira destinados às escolas do programa federal da gestão anterior foi irrisória, comprometendo investimentos que poderiam ser mobilizados em outras frentes prioritárias do Ministério da Educação.
Levantamento do FNDE demonstrou que, do total de recursos disponibilizados para infraestrutura, apenas R$ 245,8 mil foi efetivamente executado, o equivalente a 0,24% do total de recursos. “Isso demonstra a ineficiência da implementação do programa e o descompasso entre os objetivos declarados e os resultados efetivamente alcançados”, disse o representante do MEC.
Na mesma linha se manifestou a AGU (Advocacia-Geral da União). De acordo com Flávio
José Roman advogado-geral adjunto, há uma distinção clara entre o sistema de ensino militar e o sistema de educação civil, não sendo prevista uma mescla de modelos educacionais cívico-militares dentro do sistema de ensino regular.
“A Constituição, ao tratar das Forças de Segurança, especialmente da Polícia Militar, não prevê a atuação desses servidores militares estaduais em políticas públicas de educação ou em atividades de suporte à oferta da educação escolar básica”, afirmou.
O AGU adjunto também citou Paulo Freire, patrono da educação brasileira: “Se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda”.
Ambos defenderam que o trecho da Constituição de 1988 que fixa a a competência privativa para legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional. A Lei Complementar estadual em questão, portanto, cria, na visão deles, um modelo educacional que não tem respaldo na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
Ao rebater o argumento favorável de que a qualidade de escolas militares é maior, Roman afirmou que o modelo recebe maior aporte de recursos.
ENTENDA A DISCUSSÃO
As escolas cívico-militares foram também uma bandeira do governo Jair Bolsonaro (PL). O Programa Nacional das Escolas Cívico-Militar do governo federal foi lançado em setembro de 2019, primeiro ano do governo do ex-presidente. Mesmo antes da medida, escolas cívico-militares avançavam no país. Até 2015, eram 93. Em 2018, o número subiu para 120 em ao menos 22 estados. As escolas cívico-militares foram também uma bandeira do governo Jair Bolsonaro (PL).
Especialistas condenam a militarização da educação, com a presença de policiais nas unidades escolares, e afirmam que escolas convencionais também podem melhorar seus resultados se receberem atenção especial -as unidades ganharam evidência nos últimos anos por causa de indicadores educacionais positivos e por atacarem o problema da indisciplina.
A gestão Lula iniciou o processo de extinção total do programa federal de fomento a essas escolas em julho de 2023. Foi quando, pouco após a divulgação dessa iniciativa do governo federal, Tarcísio de Freitas anunciou a criação de um programa estadual de escolas cívico-militares. Ele não detalhou como será a ação e quantas unidades devem recebê-lo.
Mas a iniciativa do governo petista já se desenhava desde o início da gestão. O governo extinguiu uma diretoria criada por Bolsonaro no MEC para tratar das cívico-militares já no primeiro dia do ano de 2023.
O novo organograma do MEC não tem mais essa área, que era vinculada à Secretaria de Educação Básica desde o governo passado. Questionada sobre o que ocorreria com as unidades já apoiadas, a gestão do ministro Camilo Santana (PT) apenas declarou que há em curso um “processo de reestruturação, montagem de equipe e avaliação de programas e ações”.
*Informações da Folhapress