A nova resolução do Banco Central do Brasil que permite a transferência de dívidas contraídas em cartões de crédito pode beneficiar 349 mil pessoas inadimplentes de Mato Grosso do Sul. A regulamentação que entra em vigor a partir de 1º julho de 2024, prevê que consumidores possam fazer transição para outra instituição que ofereça melhores condições de pagamento, sem custo adicional pela mudança.
De acordo com dados da Serasa do mês abril, atualmente o cartão de crédito e dívidas com bancos são os maiores responsáveis pelo endividamento da população sul-mato-grossense. Dentre 1,076 milhão de pessoas com algum tipo de restrição no Cadastro de Pessoa Física (CPF), 32,45% (ou 349 mil) correspondem a débitos com o rotativo do cartão de crédito, a linha de crédito mais cara do mercado.
As mudanças aprovadas em dezembro de 2023 pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), junto ao teto do rotativo limitado em 100% do valor devido, já em vigor, também trazem novidade do detalhamento de faturas que terão a partir do próximo mês mais transparência em seu descritivo mensal.
Para o mestre em economia Lucas Mikael, a regulamentação terá diversos impactos positivos tanto para os consumidores quanto para o mercado de crédito como um todo.
“Além dos clientes poderem transferir suas dívidas para instituições que ofereçam melhores condições de pagamento, como juros mais baixos e prazos mais longos, isso também pode significar uma redução nos custos financeiros associados ao pagamento do crédito rotativo, que tradicionalmente tem taxas muito elevadas”.
Mikael, cita ainda a possibilidade da escolha entre diferentes ofertas de crédito funcionará como um auxílio que vai permitir que consumidores gerenciem de forma mais assertivas suas finanças, evitando o acúmulo excessivo de dívidas e permitindo ajustes conforme suas necessidades financeiras.
O doutor em Administração, Leandro Tortosa corrobora, ao pontuar que é uma medida muito importante, que vai impactar endividados e superendividados.
“Muitas vezes uma pessoa assume que tem uma dívida, ela quer pagar, mas nas condições anteriores ela não consegue, então virava uma bola de neve. Agora ela vai poder levar essa dívida para uma outra instituição e com isso de repente conseguir ou renegociar essa dívida para um parcelamento mais adequado com uma taxa de juros um pouco mais apropriada, com prazo maior e com parcelas que caibam no bolso dela”, detalha.
Para a economia do Estado, os analistas apontam que a competitividade entre os bancos deve trazer um efeito vantajoso.
“As instituições financeiras terão que competir mais diretamente pela preferência dos clientes oferecendo condições mais atrativas. Isso pode levar a uma maior inovação nos produtos financeiros e serviços oferecidos no mercado”, avalia Mikael.
Da mesma forma, economistas pontuam que a concorrência estimulada pela portabilidade pode pressionar as instituições a reduzirem suas taxas de juros para o crédito rotativo, uma vez que clientes insatisfeitos com as taxas praticadas poderão buscar melhores alternativas em outras instituições.
“Os bancos, os operadores de cartão de crédito vão brigar com esses clientes para poder oferecer essa condição de pagamento”, complementa Tortosa.
DICAS
Como orientação para melhor aproveitamento da nova legislação, o economista Eduardo Matos indica que aqueles que possuem dívidas a partir da utilização do rotativo do cartão de crédito, realizem uma pesquisa entre as instituições, optando assim pelas que possuem melhores condições.
“É interessante buscar inicialmente aquelas operadoras que o consumidor já possui relacionamento, uma vez que tende a ter uma maior abertura e, talvez, condições diferenciadas para aqueles que possuem relacionamento, em detrimento de novos clientes”, recomenda.
Matos frisa que sobretudo é importante buscar outras alternativas antes de recorrer ao rotativo.
“A preferência está em adquirir conhecimentos em educação financeira e readequar o padrão de vida”, afirma.
Mikael, acrescenta que a portabilidade do saldo devedor também facilita a gestão financeira pessoal.
“Os consumidores poderão consolidar suas dívidas em um único lugar com condições mais favoráveis, simplificando o controle de suas finanças e potencialmente reduzindo o estresse financeiro”, salienta.
O doutor em administração reforça que é necessário ter consciência sobre os gasto.
“As pessoas precisam entender que o uso do cartão de crédito tem que ser esporádico para a maior parte das pessoas, quer dizer, só quando precisa mesmo fazer uma compra a prazo e que seja muito bem coordenado com o orçamento para não haver esse descompasso entre o que se tem de retirada, ou que se tem de dinheiro sobrando e a fatura que precisa ser paga”, avalia Tortosa.
REGULAMENTAÇÃO
De acordo com o CNM a medida também será válida para os demais instrumentos de pagamento pós-pagos, modalidades nas quais os recursos são depositados para pagamento de débitos já assumidos.
Conforme o Banco Central, a portabilidade de saldo devedor de fatura de cartão de crédito não se aplica aos casos que preveem pagamento da fatura por consignação em folha de pagamento.
Quanto a transparência, as faturas dos cartões de crédito deverão trazer, a partir do primeiro dia de julho deste ano, uma área de destaque, com informações essenciais, como valor total da fatura, data de vencimento da fatura do período vigente e limite total de crédito.
As faturas também deverão ter uma área destinada ao oferecimento de opções de pagamento.
A resolução aprovada em dezembro de 2023 é a mesma que limitou os juros do rotativo do cartão de crédito a 100% da dívida e está vigente desde 2 de janeiro deste ano.
Sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a Lei nº 14.690/2023 remete ao Conselho Monetário Nacional (CMN) a fixação de limite para os juros do cartão de crédito, cobrados quando o consumidor não paga a fatura. Situação que até o início do ano era de total liberdade para as próprias instituições financeiras.
Vale destacar que essa condição vale para aquelas dívidas que foram contraídas a partir de janeiro de 2024.
“Aquelas que foram contraídas antes de janeiro deste ano ficam com aquelas taxas de juros altíssimas, algumas inclusive que cobravam em torno de 1.000% ao ano, um valor extremamente abusivo”, recorda Tortosa.
O doutor em administração ressalta ainda a vantagem de ter um teto para os juros do rotativo.
“Evitar que as pessoas tenham superendividamento que elas depois não consideram pagar e isso gerava um problema muito grande para o banco, para o credor, para quem emprestou”, comenta Tortosa que finaliza afirmando que a economia era bastante comprometida pelas altas taxas de inadimplência que a condição gerava.
Saiba – Portabilidade das dívidas com cartão de crédito
Portabilidade
A dívida com o rotativo e com o parcelamento da fatura poderá ser transferida para outra instituição financeira sem custos;
Transparência
As faturas deverão trazer, uma área de destaque, com as informações essenciais: valor total da fatura; data de vencimento da fatura do período vigente; e limite total de crédito;
Pagamento
As faturas deverão ter uma área em que sejam oferecidas opções de pagamento com o valor do mínimo obrigatório; encargos cobrados no período seguinte no caso de pagamento mínimo; opções de financiamento do saldo devedor da fatura, apresentadas na ordem do menor para o maior valor total a pagar; taxas efetivas de juros mensal e anual; e Custo Efetivo Total (CET) das operações de crédito.
Mato Grosso do Sul tem 349 mil pessoas com dívidas no cartão de crédito.