O delegado Rivaldo Barbosa, ex-chefe de Polícia Civil do Rio de Janeiro denunciado por envolvimento nos assassinatos da vereadora Marielle Franco e do motorista dela, Anderson Gomes, presta depoimento sobre o caso nesta segunda-feira, 3, à Polícia Federal (PF).
Apontado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) como um dos articuladores do atentado contra a parlamentar, Rivaldo deve seguir a linha que a defesa tem adotado e negar qualquer participação no crime. Os advogados argumentam que não há prova material na delação de Ronnie Lessa, o executor de Marielle Franco, contra o policial civil.
A PF e o Ministério Público Federal utilizaram dois argumentos para a denúncia contra Rivaldo: a evolução patrimonial do delegado no período em que ele esteve no comando da Delegacia de Homicídios da capital carioca e na chefia da Polícia Civil e a inclusão do miliciano Orlando de Curicica e do vereador Marcelo Siciliano como suspeitos de serem os mandantes no curso da investigação da Civil no caso Marielle. Essas seriam as principais suspeitas de que Rivaldo atuou para obstruir a apuração do caso.
Segundo o relatório final da investigação da PF, há indícios de que Rivaldo recebia “vantagens indevidas da contravenção para não investigar e não deixar investigar os homicídios por eles praticados” quando chefiava a DH da capital carioca. Para a PF, Rivaldo foi nomeado um dia antes da execução da parlamentar para facilitar a obstrução das apurações sobre a execução da vereadora.
Na época, a segurança do Rio estava sob intervenção federal, com o general Walter Braga Netto à frente, que depois seria ministro da Defesa e da Casa Civil no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). A nomeação foi feita pelo general Richard Nunes, à época à frente da Secretaria de Segurança Pública.
Na denúncia apresentada ao STF, o MPF diz que “Rivaldo concorreu para as infrações, empregando a autoridade do cargo de chefia que então ocupava na estrutura da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro, para oferecer a garantia necessária aos autores intelectuais do crime de que todos permaneceriam impunes”.
Os irmãos Domingos Brazão, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE), e o ex-deputado federal Chiquinho Brazão (sem partido) – apontados na investigação como mentores intelectuais do crime – teriam informado o plano de assassinar Marielle ao delegado e acertado apoio para que fosse, caso necessário, dificultada a futura apuração.
Segundo a denúncia, Rivaldo recebia quantias mensais fixas pagas por milicianos e contraventores no Rio para atrapalhar investigações. Ele teria encorajado a decisão dos irmãos Brazão, “prestando, inclusive, auxílio intelectual aos criminosos, ao orientá-los a não executar Marielle Franco durante nenhum trajeto que tivesse a Câmara Municipal como ponto de origem ou de destino”.
A defesa de Rivaldo, no entanto, questiona a veracidade das informações prestadas por Ronnie Lessa, executor confesso da vereadora.
A PF sustenta que um dos indícios de que Rivaldo atuou para embaralhar as investigações foi a evolução patrimonial do delegado. Para os investigadores, o dinheiro é fruto da atuação de Rivaldo junto a milicianos e contraventores. Este deve ser um dos focos do delegado no depoimento desta terça-feira: explicar a origem do patrimônio. A PF aponta que Rivaldo utilizou duas empresas de consultoria, em parceria com a mulher, Erika Andrade, para ocultar a origem do dinheiro arrecadado com criminosos.
O segundo indício de que Rivaldo teria participação no redirecionamentos das investigações, segundo a PF, foi a inclusão de Curicica e Siciliano como suspeitos do crime. Os dois personagens aparecem no caso em 2018.
O então policial militar Rodrigo Ferreira, conhecido como Ferreirinha, apontou Curicica e Siciliano como os mandantes do caso em depoimento à Polícia Civil. O ex-PM procurou a Polícia Federal em 2018 com a promessa de que entregar quem eram os mandantes do assassinato de Marielle.
A defesa de Rivaldo questiona os supostos indícios. A própria PF encaminhou Orlando Curicica para que ele prestasse depoimento à Polícia Civil, então responsável pela investigação. Ele procurou a Polícia Federal, por meio de denúncia, citando o miliciano e o vereador carioca como suspeitos.
A narrativa de Ferreirinha, no entanto, se mostrou inverídica. A própria advogada dele, Camilia Nogueira, relatou não acreditar no testemunho. Ferreirinha foi preso e expulso pela Polícia Militar por obstruir as investigações.
Outro ponto que contradiz a versão da PF é a indicação de Rivaldo com o objetivo de atrapalhar as investigações. Nomeado secretário de Segurança Pública do Rio de Janeiro pelo então interventor da área no Estado em 2018, general Walter Braga Netto, o general Richard Nunes, futuro Chefe do Estado-Maior do Exército, afirmou ao Estadão que a responsabilidade pela nomeação de Rivaldo como chefe de Polícia Civil durante a intervenção federal é dele “e de mais ninguém”. A versão do general quatro estrelas do Exército contraria o relatório final da PF sobre o assassinato da vereadora, de que Rivaldo ocupou o posto por “ingerência política”.