Incêndios de grandes proporções se alastram no Pantanal sul-mato-grossense, desde Aquidauana (MS) até a fronteira com a Bolívia. Em Nhecolândia, Corumbá (MS), um caminhão pegou fogo após atolar em uma área de lama e mata seca.
Há uma semana, as chamas oriundas do veículo se espalham pela vegetação, invadem fazendas e queimaram cerca de 80 mil hectares, área maior que o Distrito Federal, segundo o Corpo de Bombeiros Militar de Mato Grosso do Sul. A causa do incêndio no caminhão está sob investigação.
O coronel Adriano Noleto Rampazo, subcomandante geral do Corpo de Bombeiros, afirma que o incêndio rapidamente se intensificou devido à seca e aos ventos de 60 km/h, dificultando o combate direto às chamas.
“Tivemos mais focos de calor antes do início da temporada. Mas, na medida do possível, estamos controlando. Temos sete aeronaves contratadas, mais a nossa aeronave, todas de combate a incêndio. Helicóptero também. Além de viaturas, caminhões, caminhonetes e embarcações, estamos com uma estrutura grande”, disse Rampazo.
Um santuário de onças-pintadas e a Estância Caiman, na Reserva Natural Santa Sofia, foram algumas das propriedades atingidas pelo fogo nos últimos dias. Também foram afetadas as fazendas Paraíso, Tupaceretã e Porto do Ciríaco, na região da Nhecolândia. A Folha percorreu áreas críticas próximas a esses locais na quinta (1º) e sexta-feira (2).
De acordo com a ONG SOS Pantanal, o fogo voltou forte em algumas regiões do bioma após uma frente fria recente e efêmera. A alta temperatura reacendeu focos extintos e trouxe novos.
“Desde o primeiro dia desse incidente (com o caminhão), estamos operando em nove frentes. Esse fogo atingiu sete fazendas da região da Nhecolândia e continua se propagando em algumas regiões sem controle”, disse Leonardo Gomes, diretor-executivo da SOS Pantanal, em vídeo publicado nas redes sociais da organização.
A temporada de seca ainda não chegou ao auge, ressaltou a ONG, e a situação crítica pode se manter nos próximos meses. Tradicionalmente, o pico das queimadas no Pantanal ocorre em setembro, mas em 2024 a temporada de fogo está antecipada.
Na área mais crítica da Nhecolândia, onde há uma concentração maior de pessoal e maquinário, o acesso aos locais em chamas é o principal desafio, conta Gustavo Figueiroa, biólogo e porta-voz da SOS Pantanal.
“A percepção é que o fogo está espalhando muito rápido. Mesmo com várias equipes em campo, é difícil controlar todas as frentes porque novas frentes surgem rapidamente. Os principais desafios são o calor e a logística. É muito complicado chegar na linha do fogo. São muitas horas de carro, um terreno muito difícil de acessar. Os carros atolam, é bem complicado”, relatou Figueiroa à Folha.
A integração de combate aos incêndios envolve o PrevFogo do Ibama, Exército, Corpo de Bombeiros Militar (de MS, GO e PR), brigadas voluntárias e ONGs, além da colaboração de moradores.
Maquinários abrem aceiros para tentar bloquear as chamas. Aeronaves despejam água pelo ar. Os veículos terrestres e as embarcações transportam os grupos para a linha de frente.
De janeiro até esta quinta-feira (1º), o Pantanal contabilizou 4.997 focos de calor, um aumento de 1.593% em comparação ao ano passado, que teve 295 no mesmo período, segundo o programa BDQueimadas, do Inpe. O índice é o maior desde 1998, quando a série histórica começou.
A quantidade de focos de calor já supera a de 2020, quando foram registrados 4.331 até a mesma data. Naquele ano, cerca de 30% do bioma foi consumido pelas chamas.
De acordo com um relatório do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, até 28 de julho, a área queimada neste ano está entre 635.005 hectares e 907.150 hectares, representando cerca de 4,2% a 6,01% do Pantanal.
Na última quarta-feira (31), o presidente Lula sobrevoou as áreas atingidas por incêndios em Corumbá (MS), que concentra dois terços (67,3%) do total de fogo registrado neste ano no Pantanal, conforme o boletim mais recente da pasta ambiental. No local, Lula sancionou a lei que institui a Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo, reunindo ações para guiar a prevenção a incêndios no país.
A visita do presidente foi acompanhada pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, que destacou a força-tarefa para o combate aos incêndios, mas ressaltou que a maioria deles é causada por ação humana. “Eu faço um apelo: se não parar de colocar fogo, não há quantidade de pessoas e equipamentos que vença”, afirmou a ministra.
Em resposta à nova onda de fogo no Pantanal, a ONG WWF-Brasil ressaltou em nota que desde abril especialistas já alertavam que o bioma poderia enfrentar uma de suas piores secas neste ano, já que, mesmo na temporada de cheias, o bioma enfrentou estiagem.
“As queimadas no Pantanal não afetam apenas a biodiversidade e a população local, mas o país e o mundo perdem a maior área úmida do planeta. É preciso ações efetivas, pois já estamos com áreas queimadas maiores que as registradas em 2020”, disse Cyntia Santos, analista de conservação do WWF-Brasil.
Em junho, a Folha esteve em Corumbá enquanto a cidade se preparava para as festas juninas, cercada de fogo e fumaça. Um vídeo da celebração do Arraial do Banho de São João com labaredas ao fundo viralizou à época.
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