Dados da transparência do Ministério da Saúde apontam que 2023 foi o ano em que a fila para transplante em Mato Grosso do Sul bateu recorde. Ao todo, 526 pessoas aguardavam por um órgão no Estado, sendo a maioria delas (337) à espera de córnea. Além dessas, 186 pacientes aguardavam por rim e três por um transplante de coração.
Neste ano, também foram inseridas pessoas na fila de espera para transplante de fígado. De acordo com a coordenadora da Central Estadual de Transplantes de Mato Grosso do Sul (CET-MS), Claire Miozzo, 14 pessoas estão aguardando pelo órgão no Estado.
A Secretaria de Estado de Saúde (SES) também relatou que, neste ano, 415 pessoas esperam na fila por transplante de córnea e outras 207, por um rim. No entanto, nos dados da Pasta não há informações sobre os transplantes de coração.
Claire informa que as filas de receptores de órgãos e tecidos do País cresceram significativamente, inclusive em Mato Grosso do Sul, em função da pandemia de Covid-19, uma vez que na época houve o aumento da dificuldade de doadores serem encontrados. Enquanto isso ocorria, as filas alongavam.
“Quando muitas vezes tinha um doador, dava (o resultado do teste para a) Covid-19 positivo, e naquele momento a Covid-19 era uma contra indicação absoluta para a doação de órgãos. Com isso, as filas foram aumentando e muitos pacientes que tinham que fazer o retorno não conseguiam fazer no hospital, por causa de problemas de vaga. Então, isso fez com que aumentassem significativamente as filas”, esclarece a coordenadora da CET-MS.
No Brasil, o Ministério da Saúde aponta que em 2023 havia 68.465 pessoas na fila de espera para transplantes de órgãos e córnea, sendo a grande maioria (38.258) à espera de rim.
DOAÇÃO
A principal barreira para o transplante de órgãos ainda é a recusa familiar. Claire relata que muitas famílias nunca conversaram sobre doação de órgãos com seus entes. No momento da entrevista familiar, que é a única oportunidade para solicitar a doação, é um momento difícil e de luto, fazendo com que a família muitas vezes não aceite.
Guilherme Henrique de Paiva Fernandes, enfermeiro e coordenador da Comissão Intra-hospitalar de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplante (Cihdott) do Hospital Universitário Maria Aparecida Pedrossian (Humap-UFMS), corrobora que a principal dificuldade encontrada no processo de doação de órgãos é a recusa familiar.
Para ele, muitas vezes a família acaba recusando a doação por não saber se essa era a vontade do familiar que morreu. “Por isso, pedimos para que se declare ainda em vida que é um doador de órgãos, que avise a sua família, pois caso chegue o momento, é mais provável que a família realize a vontade que aquela pessoa externou em vida”, comenta.
Qualquer pessoa pode ser doadora de órgãos, mas Fernandes esclarece que, conforme a legislação atual, a família precisa aceitar a doação após a declaração do óbito. Entretanto, há casos de contraindicação médica para a doação, assim como também existe um tempo correto para que ocorra a extração desses órgãos e/ou tecidos a serem doados.
Esses são inclusive os principais motivos relatados por Claire a respeito da diferença entre a quantidade de potenciais doadores e a quantidade de doadores efetivos.
Em 2023, por exemplo, o Ministério da Saúde disse que 200 pessoas foram potenciais doadoras em MS. No entanto, 59 dessas recusaram, 106 passaram por entrevista e apenas 45 efetivaram a doação, sendo apenas 22,5% do total.
“Nós temos várias etapas no processo de doação. Muitas vezes, a família autoriza a doação, nós vamos fazer o exame sorológico e há a detecção de alguma sorologia positiva que impede a remoção desse órgão”, pondera.
“Muitas vezes, (o paciente) é um potencial doador, mas ele teve uma parada cardiorrespiratória antes mesmo de fechar o diagnóstico completo de morte encefálica. Então, assim, são vários os fatores que muitas vezes fazem com que uma quantidade maior de potenciais doadores efetivamente se tornem doadores”, revela a coordenadora da CET-MS.
Ainda, segundo Claire, há casos em que não é possível remover o órgão ou esse órgão está inapto para transplante, pois possui alguma patologia que não foi vista no ultrassom, entre outros fatores que fazem com que o potencial doador não seja um doador efetivo.
COMO APENAS
A coordenadora da CET-MS aponta que, para ser um doador de órgãos, é necessário comunicar a sua vontade à família em vida, porque quem vai autorizar a doação de órgãos e córneas, de acordo com a lei brasileira, é a família ou um parente de até segundo grau.
O cidadão pode fazer declarações em vida, colocando tanto em documentos como a Carteira de Identidade (RG) ou a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) quanto por meio de Autorização Eletrônica de Doação de Órgãos (Aedo).
Entretanto, mesmo que a pessoa tenha se autodeclarado em documentação ou formulário, o que continua prevalecendo é a autorização da família.
“A doação de órgãos é um ato