Em novembro, a Repórter Brasil revelou que Mettifogo assinou, entre 2020 e 2021, diversas apólices de seguro agrícola com a empresa suíça Swiss Re – uma delas, cujas coordenadas geográficas da fazenda segurada incidem dentro da área resguardada aos indígenas. Em nota enviada à reportagem à época, a seguradora não comentou o caso e disse apenas que “permanece totalmente comprometida com suas ambições e metas na área de sustentabilidade”. A íntegra pode ser lida aqui.
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Tanto os contratos da Mapfre como os da Swiss Re foram parcialmente pagos com dinheiro público, por meio do Programa de Subsídio ao Seguro Rural, do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) – por isso, vários dados das apólices são públicos, incluindo uma coordenada geográfica das propriedades seguradas. A pasta está desenvolvendo um sistema de verificação de conformidade socioambiental das fazendas beneficiadas pela política pública, mas a previsão é que essa ferramenta só esteja em operação em 2024.
Procurado, o Mapa informou que “não tinha conhecimento dos fatos relatados” e que “solicitará a manifestação da seguradora que emitiu a apólice”. “Em caso de confirmação de irregularidade, a operação será cancelada, a subvenção federal será devolvida e o beneficiário ficará suspenso de participar do programa”, confirmou o ministério, que acrescentou ainda que, uma vez que esteja em operação, o sistema permitirá realizar o monitoramento não apenas antes da assinatura do contrato, mas também após a concessão da subvenção. Leia a íntegra dos esclarecimentos aqui.
Piores formas de trabalho infantil
O grupo resgatado na fazenda segurada pela Mapfre estava alojado em um galpão sem janelas, onde dormiam e cozinhavam, segundo a fiscalização. Não havia camas, nem colchões, substituídas por tábuas, papelão ou palha. Para se proteger do frio, os indígenas usavam sacos de embalagens de produtos da fazenda e algumas cobertas. Não havia banheiros e o grupo fazia suas necessidades fisiológicas no mato.
Entre os resgatados estavam um jovem de 17 anos e uma uma criança de 11 anos – as atividades que desempenhavam, em lavoura de milho, se enquadra na Lista de Piores Formas de Trabalho Infantil publicada pelo governo brasileiro.
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Mettifogo afirmou à reportagem que os trabalhadores não quiseram ir para o alojamento que havia sido disponibilizado inicialmente, que, segundo ele, era uma boa casa. “Preferiram ir para outro lugar para ficarem sozinhos entre eles. Eles falam outra língua”, disse. Sobre a presença do menino de 11 anos, disse que não havia sido avisado sobre a idade. “Eu nem sabia que tinha esse menino lá. Você olhava e ele era maior do que os outros”, explicou.
Veto à exploração de mão-de-obra
Conceder um seguro rural para uma propriedade flagrada com trabalho escravo e infantil – ou manter o contrato assinado anteriormente ao flagrante – não representa uma infração à legislação brasileira, mas contraria as políticas Ambientais, Sociais e de Governança (mais conhecida pela sigla ESG, do inglês Ambiental, Social e Governança) e compromissos privados assumidos por companhias.
A Mapfre é signatária do Pacto Global da Organização das Nações Unidas (ONU)que prevê a eliminação de todas as formas de trabalho forçado ou compulsório, e da Agenda 2030, iniciativa da mesma organização que lista 17 objetivos de Desenvolvimento Sustentável, entre eles o de promover o trabalho decente e o crescimento econômico. O próprio Código de Conduta da Mapfre para fornecedores e parceiros de negócios ressalta a obrigação de “não utilizar qualquer forma de trabalho infantil, forçado ou escravo e subcontratar terceiros que utilizam tais práticas”.
O massacre de Caarapó
O Massacre de Caarapó resultou na morte do indígena Clodiode Aquileu Rodrigues de Souza, que era agente de saúde, com um tiro no abdômen e outro no tórax. Outros seis ficaram feridos, entre eles uma criança de 12 anos. Há testemunhas que apontam que os tiros partiram do próprio Mettifogo.
Ainda em 2016, o MPF denunciou o fazendeiro e outras quatro pessoas, que aguardam o julgamento em liberdade. O grupo responde pelos crimes de formação de milícia armada, homicídio qualificado, tentativa de homicídio qualificado, dano qualificado e constrangimento ilegal. O processo já passou pela fase de alegações finais. A 1ª Vara da Justiça Federal em Dourados decidiu que os cinco serão levados ao Tribunal do Júri por conta do crime.
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À reportagem, Mettifogo negou participação no massacre. “É um absurdo. Tem cinco pessoas acusadas de um crime só. O cara levou um tiro só e tem cinco pessoas acusadas. O laudo da Polícia Federal disse que não tem como culpar alguém por essa morte. Não tem balística do tiro. Não tem nada. É uma perseguição”, afirma.