Por: Sandra Oliveira Santos*
No dia 11 de janeiro, é celebrado o Dia de Combate à Poluição por Agrotóxicos. A data está associada ao Decreto nº 98.816/1990, que estabeleceu critérios mais rigorosos para o registro, controle, inspeção e fiscalização de agrotóxicos, seus componentes e derivados. No entanto, mais de trinta anos depois, o panorama continua alarmante: o Brasil lidera o consumo global dessas substâncias.
Recentemente, a legislação brasileira evoluiu com a Lei nº 14.785, de 27 de dezembro de 2023, e o Decreto nº 4.074, de 4 de janeiro de 2002, que regulamentam o uso de agrotóxicos, mas ainda enfrentam críticas devido à liberação de produtos já banidos em outros países. Um relatório publicado pela WWF revela que, em 2021, os 26 países da União Europeia exportaram quase 2 milhões de toneladas de agrotóxicos, movimentando 14,42 bilhões de euros. Desse montante, mais de 6,84 mil toneladas de substâncias proibidas em território europeu foram destinadas ao Mercosul.
Uma das questões mais discutidas na relação meio-ambiente e agricultura, são os agrotóxicos, substâncias químicas amplamente empregadas na agricultura e pastagens, mas também em áreas urbanas e indústrias. Seu objetivo é simples: controlar pragas, plantas invasoras e aumentar a produtividade. Esse controle se faz necessário, especialmente pelo uso mais intensivo dos solos (safra e safrinha), pela utilização de sementes crioulas sem devida preparação e pela falta de rotatividade dos tipos de plantação.
Uma das metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU é justamente a redução do uso de agrotóxicos (ODS nº 3 – Saúde e Bem-Estar). Até 2030, o objetivo é diminuir significativamente as mortes e doenças causadas por esses produtos e reduzir a poluição do ar, da água e do solo.
E não é por menos: nos últimos dez anos, 124 mil pessoas foram atendidas com quadro de intoxicação por agrotóxicos. Os dados são de 2024, da Coordenadoria de Vigilância em Saúde Ambiental, do Ministério da Saúde.
Dependendo da intensidade, duração e forma de exposição, os agrotóxicos podem causar uma série de riscos à saúde humana. Os efeitos podem ir desde irritação nos olhos, na pele e nas vias respiratórias devido ao contato direto com esses químicos, até doenças neurológicas, câncer e desregulação no funcionamento hormonal, prejudicando o crescimento, a fertilidade e o desenvolvimento. Muitas dessas doenças iniciam-se com sintomas brandos e amplos, dificultando o diagnóstico, especialmente porque ocorrem após anos de exposição ao agente tóxico.
A exposição a agrotóxicos durante a gravidez está associada a um maior risco de defeitos no desenvolvimento do feto, e crianças expostas a esses produtos podem apresentar atrasos no desenvolvimento cognitivo, motor e comportamental. A exposição prolongada a esses compostos pode levar ao desenvolvimento de condições crônicas, incluindo distúrbios hepáticos, insuficiência renal, alterações endócrinas e aumento do risco de câncer. Essa problemática evidencia a necessidade de monitoramento rigoroso da qualidade dos alimentos e da água, além de práticas agrícolas mais sustentáveis para minimizar os impactos na saúde humana.
Restrições e ajustes
No Brasil, ainda são usados agrotóxicos que já foram banidos na Europa e em outras regiões do mundo. Uma portaria do governo federal visa instituir o Programa Nacional de Redução de Agrotóxicos (Pronara), com o objetivo de substituir agrotóxicos considerados altamente perigosos, mapeá-los e fazer um programa que envolva a Embrapa e outras instituições de monitoramento da produção, comercialização e uso de agrotóxicos no Brasil. Entretanto, o Pronara ainda está em fase de elaboração.
Para tornar a agricultura menos tóxica em larga escala, a integração da engenharia genética e dos bioinsumos oferece soluções promissoras. A engenharia genética permite o desenvolvimento de culturas resistentes a pragas e doenças, reduzindo a necessidade de agrotóxicos. Além disso, a utilização de bioinsumos, como microrganismos benéficos e extratos naturais, promove o manejo biológico de pragas e a melhoria da saúde do solo, contribuindo para a sustentabilidade. O estímulo a essa prática, deve ocorrer inclusive com políticas de financiamento e fiscalização mais direcionadas ao objetivo.
É importante incluir os pequenos produtores nesse cenário, ampliando o acesso a financiamentos direcionados para práticas agrícolas inovadoras, criando políticas que ofereçam linhas de crédito específicas para a compra de bioinsumos e tecnologias geneticamente avançadas. Capacitações técnicas e programas de extensão rural também são fundamentais para garantir que esses agricultores adotem essas práticas de forma eficiente, aumentando a produtividade e a sustentabilidade. Essa abordagem contribui para a preservação ambiental e a segurança alimentar em diferentes escalas de produção.
Diante dos riscos do uso descontrolado de agrotóxicos, o Dia de Combate à Poluição por Agrotóxicos deve ser visto como uma oportunidade de repensar o uso indiscriminado dessas substâncias e buscar alternativas para reduzir seus impactos, seja nos elementos da natureza, seja na qualidade da saúde coletiva.
*Sandra Oliveira Santos, professora da Estácio e mestre em Biologia.