A defesa da salgadeira Aparecida Graciano de Souza, acusada de matar envenenado e esquartejar o marido de 64 anos, Antônio Ricardo Cantarin, tenta derrubar as qualificadoras de motivo torpe, emprego de veneno e dissimulação, que complementam o crime de homicídio pelo qual ela responde.
No dia 15 de maio, a Justiça de Três Lagoas definiu que ela irá enfrentar o júri popular, que ainda não foi marcado pelo Judiciário. O julgamento será transmitido ao vivo pelo YouTube.
A defesa da ré protocolou no processo pedido de recurso, contudo, o advogado de Aparecida, Júlio Cézar Sanches Nunes, explicou ao Jornal Midiamax que o recurso não é contra o Tribunal do Júri, mas sim contra as qualificadoras.
“Precisamos de um julgamento justo. O recurso da defesa é contra as qualificadoras, haja vista que nenhuma prova técnica constatou veneno no corpo de Antônio. Logo, não havendo prova pericial, não pode Aparecida responder pelas qualificadoras”.
Conforme a denúncia do MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul), são três qualificadoras:
- Motivo torpe, por causa da desproporcionalidade da reação gerada pela Denunciada ao envenenar a vítima Antônio por achar que ele não a valorizava;
- Emprego de veneno, porque teria dado a Antônio raticida do tipo “mão branca”;
- Dissimulação, uma vez que deu veneno ao companheiro em vez de remédios, “disfarçando sua verdadeira intenção de matar o ofendido”.
O laudo de perícia do IMOL (Instituto de Medicina e Odontologia Legal) de Três Lagoas aponta que a causa da morte foi indeterminada, mas o meio pelo qual se produziu o óbito foi envenenamento.
Ainda, segundo o relatório da perícia, Antônio apresentou pupilas dilatadas, ausência de respiração e circulação, bem como hipotermia. As partes do corpo da vítima também estavam em diferentes estados de decomposição, o que pode indicar que Aparecida congelou algumas após desmembrá-las.
O recurso apresentado pela defesa explica que todas as qualificadoras possuem como elemento essencial o veneno, contudo “há no laudo contradição, na medida em que tem como causa da morte causa indeterminada e como meio o envenenamento, sem qualquer amparo fático e científico que justifique tal inserção. Nesse aspecto, esclareça-se que o laudo de fls. 317-320 é claro ao atestar a indeterminação da causa da morte”, diz trecho do documento.
Em depoimento à Polícia Civil em 27 de maio de 2023, data na qual foi presa, Aparecida confessou dar veneno de rato ao companheiro seis dias antes, na manhã do dia 21, dizendo que era medicação. Ela disse, ainda, ter lembrado que irmã uma vez quase morreu ao ingerir o veneno por engano e, por isso, deu para o marido consumir.
À noite na mesma data, Antônio já estava morto. Sem saber o que fazer com o corpo, resolveu esquartejá-lo.
Abuso sexual e agressões
Aparecida também contou à Polícia na ocasião da prisão em flagrante que estava casada com a vítima havia cerca de dois anos, mas que Antônio passou a maltratá-la e humilhá-la. O homem sofreu um AVC (Acidente Vascular Cerebral) e tinha dificuldades de locomoção, e segundo a mulher, apesar dos cuidados, o marido, antes de sofrer o AVC, não a valorizava, ameaçando e dizendo que ela o roubava.
Segundo o advogado Júlio Cézar, ficou comprovado, ainda, que a ré era constantemente estuprada pelo companheiro. “No decorrer da instrução processual, restou demonstrado a verdade dos fatos, que Aparecida era submetida diariamente a agressões físicas e mentais, bem como era estuprada. Também que Antônio respondia pelo crime de estupro de vulnerável, e segundo relatório policial, este não seria a primeira vez que Antônio teria praticado esse tipo de crime”.
Ele explica que, durante interrogatório, a ré deixou claro ser vítima de abusos sexuais por parte do convivente.
Aparecida maltratava Antônio
Em fevereiro deste ano, a família de Antônio pediu por uma indenização a Aparecida, que responde pelo crime ‘atrás das grades’.
Segundo a família, Aparecida estava há pelo menos 1 ano antes do crime tentando passar os bens de Antônio, conquistados antes do casamento, para o nome dela. Isso, para os familiares, indica que o crime deveria estar sendo planejado há tempos.
De acordo com o advogado da família, testemunhas teriam presenciado os maus-tratos a Antônio. “As testemunhas arroladas pela denúncia foram unânimes em afirmar terem visto e acompanhado os maus-tratos qual a ré submetia a vítima constantemente, bem como sua frieza após ter matado seu marido, esquartejado e mantido partes do corpo por dias no freezer na casa onde viviam”.
Relembre o caso
O crime ocorreu em Selvíria, a 399 quilômetros de Campo Grande. Antes de morrer, Antônio ficou cerca de oito horas agonizando e passando mal, deitado na cama do quarto do casal. Em depoimento, a salgadeira disse que depois de dar o veneno para o marido, ia de 10 em 10 minutos ao quarto para ver se Antônio tinha morrido.
Após perceber que o marido estava morto, já que ele ficou com olhos vitrificados, ela colocou um lençol em cima do corpo e foi dormir em outro quarto da casa. Só no dia seguinte, preocupada com o que iria fazer com o corpo de Antônio, ela resolveu esquartejar a vítima.
O tronco de Antônio foi colocado dentro de uma mala, e a salgadeira deu em depoimento detalhes macabros de que foi difícil ‘acomodar’ o tronco do marido dentro da mala, devido ao tamanho e aos ossos do pescoço. A autora teria conhecimento de como desmembrar um corpo, já que segundo ela tinha experiência em matar porcos.
Depois, ela desmembrou as pernas, os braços e a cabeça, que foram colocados dentro de sacos pretos e acondicionados dentro de um freezer, na sua casa. Com medo que começassem a dar falta de Antônio e o corpo começasse a cheirar mal, ela resolveu se livrar das partes.
Como a mala onde estava o tronco era pesada e a mulher não conseguia carregar sozinha, ela pediu ajuda a dois vizinhos para colocar a mala no carro. Eles ainda teriam questionado o peso e o mau cheiro, mas ela deu a desculpa de que na mala havia retalhos de pano e por ter colocado veneno de rato na casa, poderia haver bicho morto nos retalhos.
Ela foi até a estrada no sentido a Três Lagoas e jogou a mala na beira da rodovia, voltando para casa em seguida.
No outro dia, quinta-feira (25), a mulher não conseguiu se desfazer do restante do corpo, pois o carro havia apresentado problema. Então, na sexta (26), conseguiu deixar as outras partes também na saída para Três Lagoas.
Ela chegou a dizer para os vizinhos que parentes do marido haviam levado ele para tratamento em São José do Rio Preto, em São Paulo, depois de questionarem o sumiço de Antônio.