Um dos assuntos mais recorrentes no país em 2024 foi o crescimento dos jogos e das apostas on-line e suas consequências. No Senado não foi diferente, com a apresentação de projetos, pronunciamentos e a instalação de comissões parlamentares de inquérito (CPIs).
Os dois colegiados com foco em apostas e jogos on-line que funcionaram neste ano seguirão trabalhando em 2025. A CPI da Manipulação de Jogos e Apostas Esportivas está autorizada a funcionar até o dia 15 de fevereiro. Já a CPI das Bets tem autorização para trabalhar até 30 de abril.
A CPI das Bets foi instalada no dia 12 de novembro e elegeu o senador Dr. Hiran (PP-RR) como presidente e a senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS) como relatora. A última reunião deste ano foi com uma representante da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Durante a reunião, a superintendente de Fiscalização da Anatel, Gesilea Fonseca Teles, defendeu a ampliação das competências da agência para efetivar o bloqueio de bets ilegais.
A relatora da CPI informou que, mesmo durante o recesso parlamentar, haverá uma equipe “que não vai parar”. Soraya prometeu continuar se dedicando ao trabalho da CPI no ano que vem, mesmo com “investidas” contra a imagem do colegiado.
Na reunião da comissão do dia 17 de dezembro, ela reclamou do que chamou de “movimento orquestrado” contra a CPI e informou que se colocava à disposição da Polícia Federal para ajudar na apuração de possíveis tentativas de extorsão. Segundo a senadora, a comissão já descobriu “coisas que mexeram com poderosos de todas as áreas”. Ela também disse que, quando faltam argumentos, a melhor defesa é o ataque. Para a senadora, também pesa o fato de ela ser mulher.
“Eu fui ameaçada e stalkeada. É importante que a população brasileira saiba: independentemente de qualquer investida contra a CPI, ou contra membros da CPI, nós vamos até o fim”, afirmou a senadora, acrescentando que tem andado com seguranças.
De acordo com Soraya, a CPI das Bets tem foco em um problema social gravíssimo, que envolve o crime organizado, com lavagem de dinheiro e evasão de divisas. Soraya disse que no ano que vem a CPI vai ouvir os chamados influencers, que usam seus canais em redes sociais para divulgar os jogos on-line. A senadora admitiu que é difícil “erguer um muro digital no país”, mas defendeu a regulamentação mais rígida das bets, de forma a minimizar os danos dos consumidores. Ela é autora de um projeto que impede a realização de apostas de quota fixa por beneficiários de programas sociais (PL 3.757/2024).
“Estamos também trabalhando em uma legislação. Já recebi até uma minuta de um projeto de lei. A CPI vai apresentar um projeto e pedir uma tramitação especial, mais rápida, para que a gente consiga minimizar os danos”, declarou Soraya.
Para o senador Dr. Hiran (PP-RR), a comissão trata de um tema de interesse nacional. Ele ressaltou que a atuação da CPI será no sentido de proteger o povo brasileiro. Dr. Hiran também cobrou que o Congresso se dedique à regulamentação da atividade.
O senador ainda lembrou que a CPI já ouviu representantes do governo e empresários, sempre com cuidado para que a comissão não se torne uma “assassina de reputações”. Para o próximo ano, Dr. Hiran indicou que a comissão seguirá ouvindo pessoas relacionadas às atividades que são objeto de investigação da CPI e tratará de temas como saúde mental e segurança para crianças e adolescentes. Ele indicou que, por conta do volume de trabalho, é possível que o funcionamento da CPI seja prorrogado.
“Vamos fazer diligências e ver como funcionam os países que sediam as plataformas. Espero que a comissão apresente um trabalho que seja digno, diante de toda a dedicação dos membros da CPI”, registrou o senador, em entrevista à TV Senado.
Manipulação e apostas
A CPI da Manipulação de Jogos e Apostas Esportivas foi instalada em abril. O senador Jorge Kajuru (PSB-GO) foi eleito presidente e o senador Romário (PL-RJ) ficou com a relatoria. Ao longo do ano, a CPI ouviu dirigentes, empresários, juízes e outros profissionais ligados ao futebol e às casas de apostas.
Em uma das primeiras reuniões, o empresário John Textor, sócio majoritário da Sociedade Anônima de Futebol (SAF) Botafogo de Futebol e Regatas, afirmou ter provas de manipulação de resultados no futebol brasileiro. Em um momento de reunião secreta, ele entregou um dossiê à comissão, com denúncias sobre irregularidades.
Na última reunião do ano, ocorrida no dia 11 de dezembro, o ex-treinador do clube Nova Cidade, do Rio de Janeiro, Ede Vicente Ferreira Júnior negou que tenha participado de irregularidades.
Para o próximo ano, Kajuru promete seguir trabalhando com dedicação. Segundo o senador, logo na retomada dos trabalhos, no início de fevereiro, a CPI deve ouvir dois empresários: William Rogatto e Thiago Chambó. Kajuru chegou a pedir a prisão de Chambó, pelo fato de o empresário não ter comparecido à CPI no dia 10 de dezembro.
O empresário é suspeito de envolvimento em fraudes nas apostas esportivas. Já Rogatto, conhecido como “rei do rebaixamento”, foi preso pela Interpol no início de novembro, em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos. O empresário também é suspeito de manipulação de resultados de futebol e campeonatos. Rogatto já foi ouvido pela CPI no mês de outubro. Segundo Kajuru, ele vai depor à CPI assim que for extraditado para o Brasil.
“Ele chegando, no dia seguinte nós faremos uma CPI em “edição extraordinária”, para que ele cumpra o que ele nos prometeu, que é a entrega de um computador onde contém gente graúda e tudo aquilo que ele ainda não denunciou”, declarou o senador.
Kajuru também informou que já em fevereiro a comissão pretende ouvir dois jogadores de futebol: Lucas Paquetá, do time inglês West Ham, e Luiz Henrique, do Botafogo. Paquetá é suspeito de manipulação em cartões recebidos. Já Luiz Henrique teve sua convocação aprovada no mês de novembro. Ele foi citado como beneficiário de duas transferências, totalizando R$ 40 mil, feitas no início de 2023, logo após o jogador ter recebido cartões amarelos quando jogava pelo Betis, na Espanha. As transações teriam partido de parentes de Lucas Paquetá.
“Na primeira quinzena de fevereiro nós ainda teremos pelo menos mais três reuniões. Aí, sim, (teremos) o relatório final e esperado do senador Romário, que eu tenho certeza que será implacável”, concluiu Kajuru.
CPI da Braskem
A CPI da Braskem foi instalada em dezembro de 2023, com o objetivo de investigar a responsabilidade jurídica e socioambiental da empresa mineradora Braskem S.A, no caso do afundamento do solo em Maceió (AL).
O senador Omar Aziz (PSD-AM) presidiu o colegiado, que teve como relator o senador Rogério Carvalho (PT-SE). A comissão encerrou seus trabalhos em maio deste ano, com a aprovação do relatório final – que pediu a responsabilização da Braskem e de 11 pessoas.
“Há ainda quem ache que a preocupação com a natureza é besteira de ecologista e que o importante é deixar a boiada passar. Esta CPI trouxe contribuições importantes para essa discussão. Que tenhamos o compromisso de levá-las adiante e fomentar uma relação mais sustentável com o meio ambiente, que tenhamos sobretudo a coragem de propor essa transformação”, afirmou Rogério na ocasião.
Desde 2018, os bairros Pinheiro, Mutange, Bom Parto, entre outros que ficam próximos às operações de mineração da Braskem, vêm registrando danos estruturais em ruas e edifícios, com afundamento do solo e surgimento de crateras. Mais de 14 mil imóveis foram afetados e condenados, forçando a remoção de cerca de 60 mil pessoas da região. As atividades de extração foram encerradas em 2019, mas o solo dessas regiões pode levar anos para se estabilizar.
Violência doméstica
O Senado também autorizou o funcionamento da CPI da Violência Doméstica. O requerimento para a criação da CPI, de autoria do senador Kajuru, foi lido em Plenário no dia 12 de março. Pelo requerimento, a CPI seria composta por 11 senadores titulares, além de 7 suplentes, e teria 180 dias de duração (RQS 157/2024).
Segundo Kajuru, a violência está presente no cotidiano das mulheres brasileiras. “Desde violência psicológica, assédio sexual e moral até o feminicídio, diferentes dimensões da violência marcam a experiência da vida de mulheres de todas as idades no país, cenário que não tem apresentado sinais de reversão”, afirma Kajuru em seu requerimento. Como o senador foi indicado como presidente da CPI das Apostas Esportivas, a CPI da Violência Doméstica terminou ficando em segundo plano. Nada impede, porém, que a comissão seja instalada em 2025.
*Com informações da Agência Senado
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