Há uma semana, o Brasil se surpreendia com a notícia de que seis pessoas que passaram por transplante na SES-RJ (Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro) receberam órgãos infectados pelo HIV de dois doadores e, após a cirurgia, testaram positivo para o vírus. O erro grave é considerado inédito, mas revolta médicos e deixa apreensiva a população que aguarda por um transplante.
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O erro no caso do Rio de Janeiro foi na execução dos exames que antecederam os transplantes, feitos por um laboratório contratado pelo governo do Estado. O temor entre a população é válido, mas especialistas em saúde afirmam que o caso é isolado. Todo o processo é extremamente seguro, tanto que o Brasil lidera como maior programa de transplante público do mundo.
Em Mato Grosso do Sul, só em 2024, 27 pacientes receberam um rim – considerado o órgão mais transplantado – e outras 215 pessoas aguardam na fila por transplante.
Testagens antes do transplante
Antes de qualquer transplante, doador e receptor passam por uma série de exames e testagens complementares para garantir que todo o processo seja seguro e respeitoso, como explica Rafaella Campanholo Grandinete, médica coordenadora da Nefrologia e responsável técnica do transplante renal da Santa Casa de Campo Grande.
Por isso, os primeiros exames que todo doador fará são aqueles para doenças infecciosas, que podem passar através do sangue ou por meio do próprio órgão. Então, são considerados obrigatórios os testes para HIV, HTLV, hepatite B e C, sífilis, chagas, exames de sorologia para citomegalovírus e toxoplasmose, que também são doenças que podem prevalecer numa transplantação, tanto em uma doação de órgão, como de tecidos.
Para entender os momentos que antecedem a cirurgia, vamos imaginar o seguinte cenário: o paciente tem um órgão compatível a uma pessoa que aguarda na fila por um rim. Então, antes da cirurgia, essa pessoa será submetida a diversos exames relacionados ao sistema renal a fim de saber se há alguma doença que possa contraindicar a cirurgia.
Outro exemplo: um paciente nasceu com problema de trato urinário congênito e aguarda na fila por uma bexiga. Antes de realizar o transplante, a equipe médica avaliará se o doador tem alguma doença relacionada e se terá que operá-lo antes para deixar a bexiga melhor. Já no caso de um paciente que aguarda um coração, será avaliado se o doador tem doenças cardiovasculares ou associadas, a fim de que o paciente transplantado não tenha nenhuma intercorrência no pós-operatório.
“Se esse paciente tem a possibilidade de doar um coração, por exemplo, é preciso avaliar o órgão primeiro. Então, às vezes é feito cateterismo, um ecocardiograma, tudo a fim de garantir a melhor função desse coração e também para confirmar que ele é viável para ser transplantado, para não ser um órgão que tem algum problema. Até porque, depois que transplantado, já não tem mais o que fazer”, explica a especialista.
Imunossupressores
Tudo certo com os exames, o próximo passo é submeter o receptador ao uso de imunossupressores, medicamentos que diminuirão sua imunidade. São eles que garantirão que o organismo do paciente não tentará lutar contra aquele órgão – ao identificá-lo como um corpo estranho – garantindo índices menores de rejeição.
“A partir do momento que usamos essas medicações, a imunidade do paciente fica prejudicada, então, se os exames não são feitos corretamente, ele tem a probabilidade de desenvolver doenças devido a isso. É por isso que fazemos o rastreio o mais sério e meticulosamente possível, para que esse paciente não desenvolva nenhuma doença no pós-operatório, nenhuma doença infectocontagiosa, cardiovascular, hospitalar, entre outras”, explica.
Por isso, o caso do Rio de Janeiro foi tão surpreendente. São muitos processos criteriosos que antecedem o transplante de um órgão. “Não existe a oferta de um órgão se ele puder levar uma doença ao paciente”, enfatiza.
Casos de morte encefálica
A situação também é criteriosa nos casos de pacientes com morte encefálica constatada. Neste caso, essas pessoas são sempre consideradas possíveis doadoras, desde que cumpram todos os requisitos laboratoriais e médicos.
“O paciente que evolui para a morte encefálica é avaliado por uma junta médica que inclui profissionais da UTI e de comitês que buscam e avaliam órgãos para os transplantes. Dentro desses comitês existem enfermeiros, médicos, pessoas que têm especialidades em avaliar esse paciente. Então, essa pessoa é avaliada clinicamente e visto se ela não tem nenhuma contraindicação a doar”, pontua.
Conforme a médica, as contraindicações, tanto nos casos de pacientes vivos ou falecidos, ocorrem apenas quando o doador tem uma doença ativa, afinal, se a doação é feita, o receptor contrairá aquela enfermidade.
“Hoje se faz testagem para Covid-19 em todos os pacientes que vão doar órgãos, independentemente se o paciente tem sintomas ou não. Se esse paciente testa positivo para esse vírus, são as equipes que decidirão se a doação é viável ou não, já que atualmente não é uma contraindicação doar com positivo para Covid”, explica Rafaella.
“Se esse paciente tiver uma infecção generalizada, por exemplo, não estará apto a doar. Ou, se ele tiver um câncer, também não será doador, porque tudo isso pode ser passado, pode ser transmitido com a doação de órgãos. Então, a avaliação médica é muito criteriosa. Esses médicos estudaram para isso. Para avaliar esse paciente, se ele tem condições de ser ou não doador”, acrescenta.
Portanto, a única coisa que pode proibir um paciente de doar é sua condição clínica, conforme Rafaella. “Às vezes o paciente é um idoso, não tem condições de doar o coração, por exemplo, mas às vezes os rins dele são bons. Porém, às vezes ele não tem condição de doar o órgão X, mas o órgão Y ele consegue. Às vezes, ele não tem condição de doar nem o rim, nem nada, mas a córnea ele tem. Então, existe essa avaliação para ver o que se pode aproveitar para outra pessoa em vida, que precisa desses órgãos e tecidos”, pontua.
Casos do Rio de Janeiro
Para Rafaella, a situação ocorrida no Rio de Janeiro pegou todos de surpresa justamente por saberem o quão criterioso este processo é.
“Somos referência no mundo. O Brasil sempre apresenta resultados muito bons e isso é um caso isolado de total irresponsabilidade de pessoas contratadas para fazer um exame, exames fundamentais para a sequência do transplante, e que simplesmente não entendem e não têm a mínima ética e moral para trabalhar com isso”, lamenta a médica.
“É um caso isolado porque é inédito o que aconteceu. Tenho certeza que as equipes de transplante darão o seu melhor para tratar esses pacientes a partir desse diagnóstico agora e o que posso falar é que quem está à espera de um órgão pode ter total confiança e tranquilidade de que todo o processo é muito bem feito, é um processo que tem várias etapas, às vezes dupla, tripla, quatro vezes a checagem. Quem trabalha com transplante faz tudo com muita seriedade. Por isso, não tenham medo porque o transplante salva vidas e melhora muito a qualidade de vida desses pacientes”, conclui.
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