Pensar em azeite de oliva no Brasil era uma realidade inimaginável há poucos anos. A cultura tem grande destaque e tradição em países como Espanha, Grécia e Itália, e encontrou no clima tropical bons resultados. Os primeiros cultivos de olivais no Rio Grande do Sul – hoje o maior estado produtor, responsável por cerca de 70% do total – datam da década de 1950.
O embaixador Batista Luzardo plantou em Uruguaiana, na Fronteira Oeste, 72 mil plantas, sendo este por um período o maior olival do Brasil. Na época, a Secretaria da Agricultura gaúcha examinou em laboratório a azeitona e o azeite produzidos, verificando que não eram inferiores aos italianos. A partir de então, a pasta passou a incentivar o plantio de olivas no estado.
Mas foi só em 2005 que o espaço de pesquisa foi ampliado. A Embrapa Clima Temperado implantou 25 unidades experimentais de observação; cada uma era composta por três árvores de 30 cultivares, totalizando 90 plantas. No projeto, também foi realizado o zoneamento climático para a cultura no Rio Grande do Sul, assim como a implantação de um banco de germoplasma com 56 cultivares definidas e dez acessos não definidos, além de identificar e monitorar as principais pragas e doenças que atacam a cultura.
Os olivais começaram a dar resultados. Nesses quase vinte anos de cultivo, novas áreas e regiões ganharam pomares. De acordo com a Radiografia da Agropecuária Gaúcha, atualmente são 6,2 mil hectares plantados, sendo metade já em produção. Na safra 23/24 foram produzidos 193,1 mil litros de azeite. A extração do azeite é feita em 25 lagares espalhados pelas regiões produtivas.
As maiores plantações estão nos municípios de Encruzilhada do Sul, Pinheiro Machado, Canguçu, Caçapava do Sul, São Sepé, Cachoeira do Sul, Santana do Livramento, Bagé, São Gabriel, Viamão e Sentinela do Sul. Desde 2019 uma lei estadual criou a “Rota das Oliveiras”, englobando 40 municípios, e busca fomentar e promover o cultivo dos olivais. Como entraves ainda estão o alto custo inicial do investimento e o tempo para começar a produzir, em média a partir do quinto ano.
Clima desafia safra
O recorde de produção de azeites gaúchos ocorreu no ciclo 2022/23, quando foram extraídos 580 mil litros. No ciclo passado, o estado teve redução de 67% na produção. A causa foi um ciclone que ocorreu em setembro, com altíssimos volumes de chuvas, afetando a floração.
Para 2024/25 há nova expectativa de baixa, em função das enchentes de maio e do clima chuvoso de setembro.
A produtora Rosane Coradini Abdala, de Caçapava do Sul (RS), destaca que é necessário mais investimento em pesquisa para buscar variedades mais adaptadas aos problemas climáticos do estado.
“No ano que vem já observamos que teremos safra baixa, aquém do que foram as anteriores. Já buscamos junto às entidades recursos para pesquisa para termos variedades mais adaptadas ao nosso clima. Em Portugal, por exemplo, são plantadas variedades de solo ácido, que é o nosso caso aqui. Também tem variedades que convivem melhor com umidade, o que é um problema nosso também”, ressalta.
Festa celebra o azeite
Neste fim de semana, a cidade de Caçapava do Sul, na Campanha, uma das maiores produtoras de azeite do estado, recebe a 3ª Festa do Azeite de Oliva. O evento começou na sexta-feira (29) e vai até o domingo (1°), no Largo Farroupilha.
No local, há exposição de azeites locais, artesanato e produtos da agricultura familiar típicos do município, um dos mais antigos do Rio Grande do Sul e considerado um Geoparque Mundial pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
Segundo o Instituto Brasileiro de Olivicultura (Ibraoliva), a cidade é uma das que mais investe no oliviturismo, outro aspecto importante da cultura. Turistas podem conhecer olivais, vivenciar a colheita e se hospedar em pousadas que ficam nas propriedades. Neste ano o evento acontece mais tarde em função da calamidade que o estado viveu.
“Não poderíamos deixar de realizar para não perder a identidade, esse fortalecimento dessa atividade. Mantemos firme nosso propósito de qualidade e Caçapava do Sul é um centro de divulgação e premiação. Com o turismo agregamos valor e já há interesse de expansão e criação de novas marcas”, aponta o presidente da entidade, Renato Fernandes.
Qualidade e excelência
São mais de 100 marcas de azeite de oliva existentes no território gaúcho. Dessas, pelo menos 11 se destacaram com premiações em concursos pelo mundo, por conta da qualidade dos produtos.
Agora, entidades representativas do setor buscam esclarecer ao consumidor a diferença entre os azeites importados e os nacionais. O Ibraoliva trabalha para a retirada da palavra “extravirgem” dos rótulos dos azeites importados.
“Acho que tivemos um ganho institucional. O governo reconheceu essa questão. São azeites virgens e não extravirgens, e temos muitas falsificações (cerca de 80% do que entra). Nisso, esse ano foi positivo. Mas vai entrar mais azeite importado no Brasil porque nós produzimos cerca de 1,5% da demanda do nosso consumo interno e ainda teremos safra menor. Temos uma preocupação com a qualidade do que vai chegar aqui”, detalha a produtora Rosane.
Desde 2021m a análise sensorial de azeites de oliva auxilia na constatação de fraudes. O painel funciona no Laboratório Federal de Defesa Agropecuária no Rio Grande do Sul (LFDA-RS) e tem o reconhecimento do Conselho Oleícola Internacional (COI).
O painel sensorial é formado por um grupo de pessoas treinadas regularmente para provar um azeite de oliva e identificar nele aromas e sabores. A ação é complementar a análises laboratoriais físico-químicas e é fundamental para determinar se um azeite de fato é extravirgem ou não.