Quando era criança, Sylvestre Campe foi levado pelo pai, Joachim Campe, e um dos irmãos para velejar pelo mundo a bordo do Saint Michel e ajudar a retratar as belezas da Terra. Foram sete anos velejando, o que transformou a vida do alemão nascido em Munique.
Dali em diante, construiu uma carreira, passou por cerca de 120 países (existem 195 no mundo, conforme critério da ONU), ganhou dois Emmy Awards (2006 e 2007) nos Estados Unidos e decidiu colocar sua experiência e olhar para agora contar o que viu no Pantanal nesse período pós-queimadas.
Ele percorreu o território em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul para apresentar um olhar sobre a região para um filme previsto para exibição internacional e nacional. O projeto está em andamento, e o cineasta alemão pretende mostrar qual é o cenário que ele encontrou na maioria das 11 sub-regiões do Pantanal.
Sylvestre fez uma viagem de mais de duas semanas, começando em Mato Grosso e chegando a Porto Murtinho, em Mato Grosso do Sul. Esse destino final foi alcançado no dia 20.
A produção desse filme, que deverá ter cerca de uma hora, vai mostrar um Pantanal visto do alto, da terra e da água.
“No meu trabalho, procuro mostrar uma visão própria. Busco ir aos lugares para ver exatamente o que está acontecendo. Quero retratar o que é que está sendo visto no Pantanal. Um trabalho que vai para a Alemanha e também para outros locais”, comentou o cineasta, em conversa que manteve com a reportagem durante sua passagem por Corumbá.
Neste ano, por exemplo, Sylvestre viajou da Noruega ao Mar de Bering, no Alaska (EUA), para retratar como estão as geleiras no Ártico.
“Queria retratar se é fato o que falam do derretimento. Identifiquei que o cenário pode não ser como está na grande mídia, mas é uma realidade que existe o derretimento”, abordou, ao indicar a superprodução que conduziu para o Media ETC, Canal Off e Globoplay, no primeiro semestre deste ano.
O cineasta buscar obter imagens exclusivas e detalhadas de um território usando gravações feitas pelo ar, voando em um paramotor. A aeronave tem estruturas dobráveis, e por isso ele consegue transportá-la para quase todos as locações que vai filmar. No Pantanal, ele fez registros aéreos em diferentes pontos, incluindo a Serra do Amolar.
Essa região, que fica entre Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e a Bolívia, foi atingida gravemente por incêndios em outubro deste ano. Por ser um dos locais mais conservados do Pantanal e o segundo pico mais alto do bioma, o fogo pode gerar diferentes danos para a biodiversidade.
O território pantaneiro tem enfrentado, de forma geral, sua pior estiagem em mais de um século. Uma condição que começou em 2019 e ainda não há sinais de quando essa etapa vai terminar, conforme análises de cientistas feitas até este mês.
O pico dessa escassez hídrica na maior planície alagável do mundo, que é patrimônio natural da humanidade, foi alcançado neste ano, quando o nível do Rio Paraguai atingiu 69 centímetros negativos na régua da Marinha do Brasil em Ladário, no dia 17 de outubro. Até então, o menor registro tinha sido 61 cm negativos, em 1964.
Reflexo dessa falta de água foi o registro de fogo de forma intensa em diferentes regiões pantaneiras. O Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais (Lasa) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) identificou que 17,34% da área do Pantanal foi queimada entre janeiro e dezembro deste ano, o equivalente a 261.825 hectares.
Esses registros aconteceram apenas quatro anos após outro grave incêndio, que ocorreu em 2020 e devastou mais de 25% do Pantanal. A sucessão de incêndios graves pode trazer danos que ainda estão sendo mensurados.
Há estudos, como o “Neotropical Mammal Responses to Megafires in the Brazilian Pantanal”, que tem envolvido pesquisadores do Instituto Homem Pantaneiro (IHP), de Corumbá, que já identificaram que os incêndios em regiões com alta densidade de biodiversidade conseguem reduzir em mais de 37% o habitat de cutias, mais de 82% da ocupação de tatus-canastras, mais de 23% da presença de queixadas e quase 10% de influência na redução da área de vida de onças-pardas.
Sylvestre Campe, que gravou filmes, documentários e séries para Rede Globo, Canal OFF, GloboSat, Discovery Channel, CBS, ZDF, France 5 e M6, prevê indicar o que está sendo encontrado no Pantanal e em regiões de Mato Grosso, bem como em áreas rurais de Corumbá e Porto Murtinho. Houve algumas gravações feitas também dentro dessas cidades, mas as imagens prioritárias são das paisagens.
Para compor esse trabalho, o cineasta usa também as memórias de um território visto no passado. Ele já filmou o Pantanal, durante um trabalho que durou dois meses, para produzir o documentário “60 Dias no Pantanal”, feito com Thais Tavares e Yasmin Volpato e lançado em 2020.
O cineasta alemão também esteve no Pantanal na década de 1990, quando chegou ao Brasil e acabou escolhendo o País como local de sua casa. Hoje ele vive no Rio de Janeiro.
Saiba – Cineasta teve apoio de profissionais de MS
Nessa trajetória pelo Pantanal, neste ano, Sylvestre contou com apoio logístico e suporte de profissionais de Mato Grosso do Sul, como é o caso de Cícero e Giancarlo Peralta, que são guias especializados em Pantanal.