‘Intimidação’
Ativistas e organizações entrevistadas por Repórter Brasil dizem que as ações da empresa buscam criminalizar os movimentos sociais.
“Há pessoas acusadas nesta queixa-crime que nem se conhecem, mas é mais um passo na estratégia de estabelecer domínio sobre esta área. Nenhum crime é descrito porque não há intenção de invasão. controle ou propriedade sobre a área”, afirmou a assessora jurídica da Amazon Watch Ana Alfinito.
Alvo de Belo Sun, o ex-diretor da ONG International Rivers Brent Millikan acredita que a empresa está tentando praticar intimidação. “É uma forma de desviar a atenção (do projeto), assim como aquele velho ditado de que a melhor defesa é o ataque. Mas este é um ataque infundado num contexto em que suas ações são indefensáveis”, disse ele. Repórter Brasil.
Millikan não é diretor da ONG desde junho de 2021 – um ano antes da ocupação criticada pela empresa. Mas ele vê as exigências dos agricultores como legítimas. “Não foi um movimento de tomada de propriedade privada. Eram agricultores familiares, clientes da reforma agrária, protestando contra a apropriação indébita de território destinado à reforma agrária. Foi uma ação absolutamente legítima. É importante contextualizar”, disse.
Amazon Watch, também alvo de Belo Sun, está coletando assinaturas em uma petição para apoiar “movimentos sociais, organizações e defensores de direitos vítimas de tentativa de criminalização por parte de Belo Sun”.
Procurada, a Belo Sun afirmou que “tem feito tudo de acordo com a lei” e disse que apenas sugeriu “as prisões que forem necessárias em caso de flagrante delito”.
“Há liminar reconhecendo o ato ilícito, ou seja, a existência de trespasse criminoso, e determinando a reintegração de posse em favor da empresa – decisão que não foi alterada até o momento”, diz a nota da empresa, acrescentando que o processo de a reintegração de posse judicial permanece ativa, aguardando decisão final sobre o mérito (veja o comunicado completo).
‘Sinais de fraude’
Quando mais de 50 agricultores com apoio de indígenas e ribeirinhos contrários ao projeto ocuparam a área, a Defensoria Pública do Estado e a Defensoria Pública da União já haviam ajuizado ação civil pública contra Belo Sun na qual apontaram indícios de ilegalidades na transferência de terras federais para a empresa.
Segundo a Defensoria Pública, antes mesmo de receber o terreno do INCRA, a Belo Sun havia adquirido lotes no Projeto de Assentamento Ressaca entre 2012 e 2016. No Brasil, comprar e vender lotes de reforma agrária é ilegal.
Durante o governo Jair Bolsonaro, após supostamente adquirir esses lotes de assentados, o INCRA concedeu à Belo Sun uma concessão de 2.428 hectares (24 quilômetros quadrados) na região da Volta Grande do Xingu, trecho do rio Xingu localizado logo após a barragem de Belo Monte. . Pelo contrato, assinado em 26 de novembro de 2021, o INCRA terá participação direta nos lucros da Belo Sun.
Os defensores públicos obtiveram documentos que mostram que a Belo Sun adquiriu, na prática, um total de 3.495 hectares, indicando “fortes indícios de fraude” segundo a ação, uma vez que transferências de terras a estrangeiros superiores a 2.500 hectares devem ser aprovadas pelo Congresso.
A transferência também é analisada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) desde o final de 2021. Relatório do departamento técnico do Tribunal obtido por Repórter Brasil mostra que também suspeitava de ilegalidades na transferência de terras para a Belo Sun. Por isso, cobrou esclarecimentos do INCRA e da Agência Nacional de Mineração (ANM).
“Os fatos indicam que, diante da negociação irregular dos lotes, o INCRA buscou conferir validade jurídica à posse da área pela Belo Sun por meio do Contrato de Concessão de Uso firmado, favorecendo a empresa em detrimento dos assentados que foram excluídos da Lista de Beneficiários da Reforma Agrária ”, diz o relatório do Tribunal de Contas. O INCRA não respondeu aos pedidos de esclarecimentos.
Reintegração de posse
Além de tomar medidas legais contra os críticos, a mineradora também tenta fazer com que a polícia imponha a reintegração de posse da área ocupada pelos manifestantes. No ano passado, um juiz concordou com o afastamento dos ativistas, mas determinou que fosse tentada uma solução amigável pela comissão de conflitos fundiários do Tribunal de Justiça do Pará, o que não foi feito até o momento.
Ao tentar avançar na extração de ouro, a mineradora canadense sofreu uma derrota jurídica em setembro passado, quando o Primeiro Tribunal Regional Federal negou um recurso e forçou o órgão ambiental brasileiro IBAMA a assumir o licenciamento ambiental do projeto de mineração na Volta Grande do Xingu.
Antes da denúncia criminal contra os manifestantes, Belo Sun tentou uma ‘solução amigável’, segundo Clóvis Osmar Perleberg, um dos integrantes do acampamento Nova Aliança.
“Um advogado e um funcionário da empresa vieram ao acampamento propor uma solução amigável para que não enfrentássemos a vergonha de sermos expulsos pela polícia. ,” ele disse.
A empresa afirmou em comunicado que o processo de licenciamento é realizado “de acordo com as leis, regulamentos e decisões judiciais”. “A empresa obteve a licença ambiental prévia em 2014 e a licença de instalação em 2017. Ainda em 2017, a licença ambiental prévia foi suspensa e condicionada à aprovação do plano ambiental básico do componente indígena pela FUNAI e pelo órgão licenciador ambiental competente. O plano foi apresentado à FUNAI em março de 2023 e a empresa vem trabalhando no assunto junto ao órgão desde então.”
A nota diz ainda que a licença ambiental definitiva está sendo discutida com o IBAMA, “o Primeiro Tribunal Regional Federal reafirmou que as licenças emitidas no passado pela SEMAS permanecem em vigor e que a empresa não precisará reenviar seus pedidos dessas licenças para IBAMA” (veja a nota na íntegra).