Entre escombros, entulhos e lama, alguns barracos ainda resistem, tão frágeis quanto a esperança dos moradores. Dez meses após a tragédia, famílias que ainda residem na favela Mandela seguem no aguardo de uma moradia definitiva. Enquanto esperam, enfrentam a insegurança e sensação de abandono.
Em 16 de novembro de 2023, um incêndio devastou a comunidade, deixando 38 famílias desabrigadas. No mês seguinte, a Prefeitura de Campo Grande anunciou que todas as 187 famílias que viviam no Mandela receberiam uma casa.
A construção das moradias começou em dezembro, com prioridade para as famílias atingidas pelo incêndio, e, de fato, 100 casas já foram entregues. No entanto, para os que ficaram, resta esperar que a promessa se cumpra até novembro deste ano, prazo estipulado pela Emha (Agência Municipal de Habitação e Assuntos Fundiários).
Abandono e desassistência
Há oito anos, Maria* vive no Mandela e, junto aos seus cinco netos, luta para garantir o mínimo de dignidade à família.
Ela conta que a promessa de novas moradias trouxe esperança para toda a comunidade. No entanto, com a demora na entrega das casas, o local se tornou abrigo para dependentes químicos, que muitas vezes cometem furtos nos barracos para sustentar o vício.
“Sinto medo e insegurança, a prefeitura não presta assistência para quem ficou. Ontem mesmo escutei alguém tentando entrar na minha casa”, diz.
Conforme a moradora, após a retirada de grande parte das famílias, os barracos foram demolidos pela prefeitura, mas os escombros ficaram para trás, o que resultou em acúmulo de lixo e atraiu animais peçonhentos. Assim, o local ficou em completo abandono, e as vielas se transformaram em pontos de consumo de drogas.
“A Emha entregou as casas, desocupou os barracos e derrubou tudo. O problema é que deixaram todo o entulho aqui. Têm materiais inflamáveis, se pega fogo morre todo mundo “, lamenta.
“Tenho que escolher se bebo água ou tomo banho”
Outro fator preocupante está na desassistência, em meio ao tempo seco e as altas temperaturas, a água mal chega e o pouco que chega é insuficiente para suprir a demanda dos moradores. Além disso, com frequência, moradores vizinhos da comunidade aproveitam o acúmulo de lixo para atearem fogo no local.
“Falta de água diariamente, às vezes sai um fio que acaba em questão de horas, hoje minha filha acordou 4 horas e não tinha água mais”, diz a moradora.
Joana* mora com o marido, que sai para trabalhar pela manhã e só retorna por volta das 19h. Durante esse tempo, ela precisa lidar com a insegurança, gerada pela concentração de dependentes químicos na comunidade.
‘Nem consigo dormir à noite, ouço pessoas andando por aí e tenho medo de entrar em casa. Além disso, com os entulhos, surgiram bichos. Sempre mantive a casa limpa, mas de uns tempos pra cá, a infestação aumentou.
R$ 15 milhões em investimentos
Ao todo, o município investiu R$ 15 milhões em recursos para construção e retirada das famílias que residiam no Mandela. Cada família contemplada deverá pagar 10% de um salário mínimo, que pode ser dividido em até 30 anos.
Conforme anunciado pela prefeitura, as serão realocadas em casas construídas nos bairros José Tavares, Iguatemi 1 e 2, Jardim Talismã. Nessas áreas, ocorreu um sorteio para definir a ordem da retirada, com prioridade aos moradores inscritos na Emha (Agência Municipal de Habitação e Assuntos Fundiários).
As novas unidades habitacionais, construídas por meio do Programa Credihabita, abrangem todas as famílias afetadas, com previsão de conclusão em até 12 meses.
O Jornal Midiamax questionou a prefeitura de Campo Grande sobre o andamento das obras e as reclamações relatadas pelos moradores, mas não obteve retorno. O espaço segue aberto.
*Nome fictício para preservar a identidade da fonte.
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