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crimes brutais evidenciam desafios na proteção das mulheres em Dourados

Feminicídios: crimes brutais evidenciam desafios na proteção das mulheres em Dourados

No Dia Internacional da Mulher, celebrado em 8 de março, a reflexão sobre os direitos das mulheres e o enfrentamento à violência de gênero se tornam ainda mais urgentes. Em Mato Grosso do Sul, a luta contra o feminicídio segue como uma realidade dolorosa, que desafia as autoridades e a sociedade a combater esse tipo de crime com mais eficácia.

Os índices de violência contra a mulher seguem alarmantes em Mato Grosso do Sul, que, no ano passado, registrou a segunda maior taxa de feminicídios do país. Dados da Secretaria de Justiça e Segurança Pública (SEJUSP-MS) revelam que, nos últimos três anos (2022, 2023 e 2024), foram contabilizados 107 casos no Estado, nove deles em Dourados.

Somente em 2025, já foram registrados seis feminicídios – com um registro no município -, evidenciando a gravidade do problema.

O Ministério Público, a Polícia Civil e a OAB discutem os desafios enfrentados na persecução penal desses crimes e as lacunas que ainda precisam ser preenchidas para garantir segurança às vítimas.

O promotor de Justiça Luiz Eduardo Pinheiro, que atua no Tribunal do Júri de Dourados, acompanha de perto casos de feminicídios e violência contra a mulher no município.

“O enfrentamento à violência doméstica de gênero é um grande desafio. Como Ministério Público, temos atuado com firmeza para punir os autores de assassinatos de mulheres. Lamentavelmente, na prática cotidiana, temos visto com frequência a matança de mulheres por homens”, disse ao Dourados News.

Pinheiro destacou a importância de ações preventivas para evitar que casos de feminicídio cheguem ao Tribunal do Júri.

Segundo ele, o feminicídio é um crime que já se anuncia com sinais claros de violência contra a mulher antes de seu desfecho fatal.

“Tudo deve ser feito para não chegar à Vara do Júri”, afirmou. O promotor ressaltou que, ao se tratar de um feminicídio, não há mais o que fazer a não ser responsabilizar o autor pela perda irreparável de uma vida. Para ele, a prioridade do sistema de proteção deve ser justamente prevenir essas tragédias, garantindo a segurança das mulheres e evitando que o ciclo de violência chegue a esse ponto extremo.

O promotor de justiça, com base em sua experiência em julgamentos de feminicídios, explicou que os motivos que levam à violência contra a mulher costumam ser banais. “Na prática, vemos que o ciclo da violência está sempre relacionados a motivos frívolos, banais e torpes, tudo alegado como justificativa para atentar contra a mulher. Cito como exemplos vistos na prática”, afirmou.

Ele compartilhou exemplos que observou em vários casos no tribunal, como homens que se irritam pela ex-companheira iniciar um novo relacionamento ou que se tornam agressivos ao chegar em casa embriagados.

Com o agravamento da situação, o Brasil tem endurecido a legislação para punir os autores de feminicídio. Em outubro de 2024, entrou em vigor a Lei 14.994/24, conhecida como ‘Pacote Antifeminicídio’, que instituiu o feminicídio como crime autônomo e aumentou a pena para 20 a 40 anos de prisão.

Ampliação de estrutura

Atualmente, uma das dificuldades enfrentadas pelas vítimas de violência doméstica em Dourados é o horário de funcionamento da Delegacia da Mulher, que atende apenas em horário comercial.

O delegado regional da Polícia Civil, Adilson Stiguivitis, reconhece essa questão e afirma que a rede de proteção tem sido constantemente ampliada.

Segundo ele, ações voltadas ao enfrentamento da violência contra a mulher estão sendo intensificadas, destacando a instalação da Sala Lilás na Depac para garantir um atendimento mais humanizado como um dos avanços.

“Recentemente, foi criada na Delegacia Geral da Polícia Civil, em Campo Grande, uma comissão de estudo para melhorias no atendimento e proteção às vítimas, com o objetivo de ampliar as ações das Delegacias da Mulher. Entre as propostas em análise, está a possibilidade de atendimento 24 horas.”, explicou ao Dourados News.

Para a advogada Eliselle Lopes, presidente da Comissão da Mulher Advogada da OAB de Dourados, o enfrentamento desse problema exige mudanças estruturais, desde a aplicação rigorosa das leis até a conscientização da sociedade.

“A subnotificação dos casos e a naturalização de comportamentos agressivos dificultam a efetividade da Justiça. Além disso, muitas vítimas enfrentam barreiras para acessar os mecanismos de proteção, seja por medo, falta de informação ou ausência de apoio adequado”, afirma Eliselle.

Ela destaca ainda que o fortalecimento dos serviços jurídicos e psicossociais, aliado a campanhas de conscientização e à educação sobre igualdade de gênero, são fundamentais para transformar essa realidade.

“É preciso garantir que as vítimas tenham acesso a suporte jurídico eficiente e que a sociedade compreenda a gravidade da violência de gênero. Somente com um compromisso coletivo poderemos superar esses desafios e garantir justiça para todas as mulheres”, conclui.

Casos de repercussão e a frieza dos criminosos

No contexto de Dourados, alguns casos de feminicídio chamam atenção pela crueldade e pela frieza dos autores.

Documentos de denúncias e sentenças aos quais o Dourados News teve acesso mostram que, na maioria dos casos, as mulheres são mortas dentro de casa, muitas vezes na presença dos filhos, por companheiros ou ex-companheiros que não aceitam o fim do relacionamento ou usam motivos banais para justificar a violência.

Um dos casos que escancara essa brutalidade é de uma mulher assassinada pelo marido, que, logo após o crime, enviou mensagens à mãe demonstrando frieza e desdém, afirmando que “não daria em nada”.


Assim como em muitos casos de feminicídio, o crime foi cometido na presença do filho da vítima, que estava na casa no momento do assassinato, sem saber o que havia acontecido.

Na manhã seguinte, ele preparou o café da manhã e levou até o quarto da mãe, sem perceber que ela já estava morta. Horas depois, ao notar que ela não saía do quarto, resolveu entrar e viu manchas de sangue no colchão. Ao retirar o travesseiro que cobria o rosto da mãe, percebeu sinais de que algo estava errado.

Desesperado, tentou acordá-la, mas ela já estava sem vida, com o corpo enrijecido pela morte.


A socióloga da UFGD (Universidade Federal da Grande Dourados) Marisa Lomba explica que raramente o feminicídio ocorre de forma simples.

“Mulheres são esganadas, levam panelada na cabeça, golpes de machado, facadas, são asfixiadas, suas cabeças são esmagadas com o carro, são queimadas, essas características são comuns e lidas em manchetes de jornais”, pontuou.

“Eles carregam uma simbologia violenta. Isso revela não apenas um desejo de matar, mas de aniquilar a identidade da vítima, algo que tem raízes profundas no sentimento de posse e dominação sobre a mulher”, explica a especialista.

A raiz cultural da violência contra a mulher e a falta de política eficazes

Marisa destacou que a raiz da violência contra a mulher está profundamente enraizada na cultura, o que torna essencial atacar o problema em sua origem, e não apenas focar na punição.

“Se não olharmos para a raiz do problema, os crimes vão continuar acontecendo. Os governos têm investido na punição e no combate direto aos agressores, mas precisamos ir além: as políticas públicas devem ser voltadas para a prevenção. A violência de gênero só será reduzida quando tivermos processos educativos amplos, que envolvam diversos espaços sociais e também a mídia.”

Para ela, uma das estratégias mais eficazes é o investimento massivo na educação, com a escola como principal espaço para essa transformação.

“Desde a educação infantil, as crianças precisam aprender a identificar abusos e entender como eles ocorrem, sempre respeitando suas idades e capacidades de aprendizagem. Isso significa reconhecer comportamentos abusivos, entender de onde vêm e, ao mesmo tempo, fortalecer a autoestima e a autonomia das meninas para que não desenvolvam dependência emocional dos homens.”, explicou.

Onde buscar apoio

Diante do cenário alarmante, é fundamental que as vítimas de violência saibam onde buscar apoio antes mesmo de formalizar uma denúncia. Em Dourados, diversas redes de proteção oferecem assistência jurídica, psicológica e social para mulheres em situação de risco. Confira mais detalhes sobre esses serviços na nossa reportagem especial sobre redes de apoio.

Fonte: Dourados News

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