A taxa de juros do cartão de crédito rotativo atingiu 445,7% ao ano em março de 2025, segundo o Banco Central (BC). É o maior patamar para o mês desde 2017, quando os juros chegaram a 490,3%. O índice representa um aumento de 2,5 pontos percentuais em relação a fevereiro, mantendo o crédito rotativo como a modalidade mais cara do mercado. A situação gera preocupações quanto ao endividamento das famílias e à necessidade de medidas mais eficazes de proteção ao consumidor.
O crédito rotativo entra em ação quando o cliente não paga o valor integral da fatura do cartão de crédito e opta por quitar apenas uma parte, financiando o restante com juros elevados. A regra atual determina que, após 30 dias, a dívida seja transferida para o parcelamento com condições melhores, mas na prática, o custo ainda é alto. Desde a entrada em vigor do limite legal de 100% sobre o valor original da dívida, criado pelo Congresso, esperava-se uma desaceleração, o que não se confirmou.
De acordo com o BC, os juros para pessoas físicas no rotativo aumentaram 23,7 pontos percentuais em 12 meses. Outras modalidades também apresentaram elevação: o crédito livre para famílias chegou a 56,4% ao ano e o cheque especial, a 134,2%. O endividamento das famílias alcançou 48,2% da renda mensal, e a inadimplência, embora estável, preocupa por manter-se em 3,8%.
Em entrevista exclusiva, o economista Luiz Carlos Ongaratto detalha os fatores que mantêm os juros do rotativo em patamares exorbitantes. “Eles são altos porque o risco de inadimplência também é elevado. Geralmente, quando o consumidor recorre ao rotativo, é por já estar com dificuldades financeiras. Recomendamos, nesses casos, buscar alternativas como empréstimos com juros mais baixos. O cartão de crédito não deve ser usado para despesas do cotidiano. Ele deve ser uma ferramenta de conveniência, e não uma extensão da renda”, explica.
Ongaratto também observa que o perfil de consumo do brasileiro influencia nas taxas. “Em muitos países, o uso do crédito é mais disciplinado. Lá fora, o parcelamento tradicional é mais comum do que o uso extensivo do cartão. Isso permite aos bancos um controle de risco maior. No Brasil, a frequência de uso do cartão e o baixo nível de educação financeira tornam o cenário mais arriscado, forçando os emissores a elevar os juros para se protegerem”, aponta.
Outro fator é o impacto limitado da taxa Selic, atualmente em 10,75% ao ano. “Apesar de a Selic ser a taxa básica da economia, ela influencia de forma indireta os juros do cartão. Os patamares do rotativo estão muito acima da Selic porque o modelo de concessão de crédito no Brasil envolve margens de risco muito amplas. Ou seja, mesmo com a queda da Selic, o rotativo continua absurdamente caro”, afirma Ongaratto.
Estudos do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) indicam que o brasileiro médio compromete mais de 30% da sua renda com dívidas. E o cartão de crédito é o principal vetor desse endividamento. Segundo levantamento da Confederação Nacional do Comércio (CNC), 77% das famílias brasileiras têm algum tipo de dívida, sendo o cartão a modalidade mais presente. Desse total, 41% afirmam ter dificuldade em pagar o que devem.
Para conter a escalada do endividamento, o governo e o Congresso discutem medidas como a portabilidade gratuita da dívida do cartão para outras instituições financeiras, o que facilitaria a migração do saldo para taxas mais baixas. A proposta ainda está em tramitação, mas especialistas defendem que ela pode estimular a concorrência entre bancos e reduzir os custos para o consumidor final.
Enquanto isso, Ongaratto defende ações de educação financeira como política pública permanente. “É fundamental ensinar desde cedo como lidar com o dinheiro. Se o consumidor souber administrar sua renda e evitar o uso do crédito como complemento do salário, o país como um todo ganha. Promover o consumo consciente e o planejamento financeiro é o único caminho para reduzir a dependência do crédito rotativo”, conclui.
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