Pâmela Myrela teve 90% do corpo queimado após ter a casa incendiada no fim de semana e morreu nesta terça-feira (21)
A Justiça manteve a prisão das duas travestis, de 22 e 35 anos, acusadas pela morte de Pâmela Myrela, de 31 anos, nesta terça-feira (21). O crime aconteceu na madrugada de domingo (19) quando a vítima teve 90% do corpo queimado após ter a casa incendiada com gasolina na Vila Carvalho, em Campo Grande.
Pâmela ficou internada na Santa Casa em estado gravíssimo até a madrugada desta terça (21). Ela teve queimaduras de 2º e 3º graus, por todo dorso, face, pescoço e membros, mas não resistiu aos ferimentos e foi a óbito.
As duas acusadas foram presas em flagrante na madrugada de segunda (20) pela Polícia Civil. Na manhã desta terça (21), elas passaram por audiência de custódia, onde a juíza de Direito, Eucelia Moreira Cassal, decidiu pela prisão preventiva.
Em relação à jovem de 22 anos – também envolvida na morte do caminhoneiro Jeferson Pontes Barbosa, há 13 dias em um motel na Vila Taveirópolis – a juíza considerou a gravidade concreta do crime praticado por meio cruel, colaborando para que houvesse o incêndio na casa de Pâmela.
Personalidade
Ainda, conforme a magistrada, a travesti possui personalidade à prática de crime violento. “A despeito de sua primariedade, observo que a custodiada possui personalidade à prática de crime violento, bem como pela ausência de comprovação de trabalho lícito e residência fixa, entendo não ser recomendável a concessão de liberdade provisória, nem ser recomendável a concessão de medidas cautelares mais brandas’, decretou a juíza Eucelia Moreira.
Já na audiência de custódia da outra acusada, a juíza ressaltou que a mesma colaborou para criar o incêndio no imóvel onde Pâmela estava naquela madrugada de domingo (29). “O que demonstra personalidade voltada à prática de crimes violentos e, embora não tenha antecedentes criminais, é suficiente para sua segregação’.
Assim, a magistrada decretou a prisão preventiva das duas e elas foram encaminhadas ao presídio.
“Mãe nenhuma quer isso’, diz Iraides sobre a morte da filha
Ao lado de amigos e do genro, a mãe de Pâmela Myrela contou, bastante abalada, que esteve com a filha quatro dias antes do fato. O crime aconteceu em pleno mês da Visibilidade Trans.
Iraides Rosa Ferreira explicou que Pâmela é natural de Trindade, em Goiás, e veio para Mato Grosso do Sul há dez anos a trabalho. “Ela gostava muito de Campo Grande’, disse. A família faz ‘vaquinha’ para que ela seja enterrada em Goiás.
Explicou que a filha era uma pessoa feliz e muito carinhosa. Como toda a família mora em Goiás, Pâmela, que é a mais velha entre os irmãos, além de ligar todos os dias para a mãe, ia todos os anos para a cidade natal.
Ela, inclusive, havia ido para lá no final do ano e retornou para Campo Grande na última quarta-feira (15), quatro dias antes do crime. “Saiu na quarta e domingo já aconteceu essa tragédia’, lamentou a mãe.
A mãe, logo ao ficar sabendo do caso, se organizou para vir para MS, mas chegou nesta terça-feira (21) já com a pior notícia, a da morte da filha. “Mãe nenhuma quer isso. Não quer que tire o filho da mãe’, disse.
A família quer que o velório e enterro de Pâmela ocorra em Trindade, Goiás, cidade onde nasceu. Para isso, pedem ajuda para custear o translado do corpo e outras despesas. A expectativa é arrecadar cerca de R$ 10 mil para a ajuda.
Ajuda de qualquer valor através o Pix da mãe de Pâmela, Iraides Rosa Ferreira (62) 99258-6602.
Discussão e crime
Pâmela estava internada desde domingo (19) após ter o corpo incendiado na Vila Carvalho, em Campo Grande. Ela não resistiu e morreu na madrugada desta terça-feira (21).
A travesti havia se envolvido em uma discussão em uma boate. Depois ela foi para casa, mas as duas autoras, enfurecidas, foram até um posto de combustível, compraram gasolina e seguiram para a casa da vítima.
Lá elas chamaram a vítima, que, ao sair no portão, teve o corpo atingido por combustível. Em seguida, as autoras atearam fogo na vítima.
A amiga da vítima, de 26 anos, prestou depoimento na delegacia, onde relatou que as duas foram até uma boate na noite de sábado (18) com outros três amigos. Por volta das 3 horas da madrugada, chegaram ao local duas travestis alteradas e aparentemente sob efeito de drogas ou álcool. Segundo a amiga, a dupla estaria procurando confusão no local.
Vítima estava em choque e com corpo queimado
Ainda em depoimento, a amiga da vítima disse que após trocar de roupa, retornou ao imóvel dela, momento em que se deparou com a travesti parada na porta em choque e com o corpo todo queimado.
A mulher contou à polícia que a vítima pediu para ela socorrer seu cachorro, que estava embaixo da cama. Então, ela entrou na casa, viu o imóvel queimado e conseguiu socorrer o animal, segundo o depoimento.
Contudo, no momento em que a amiga saía de dentro da casa com o cão no colo, ela viu as duas suspeitas retornando ao local e gritando. Logo, a vítima teria pedido que a amiga fugisse. Então, ela soltou o cachorro e correu para casa, onde pegou uma faca e minutos depois retornou até o imóvel da vítima.
Suspeitas fugiram
Porém, quando a amiga chegou no imóvel da travesti, a amiga afirmou que a dupla já havia sumido do local. Em seguida, a vítima teria dito à amiga: “Olha o que ela mandou para mim, olha o que as meninas dela fizeram, olha como eu fiquei, amiga’, segundo o registro policial.
Logo, a amiga notou que a travesti estava com o corpo tomado por fumaça e queimada, mas não dizia sentir dor, apenas pedia que salvasse seu cachorro de estimação. Antes da chegada do socorro, a vítima ainda teria pedido para fumar um cigarro.
Depois, chegou uma equipe do Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência), que realizou os primeiros atendimentos e a vítima chegou a desmaiar devido às queimaduras. Assim, a equipe a levou para a Santa Casa, com mais de 90% do corpo queimado, onde ficou entubada na UTI (Unidade de Terapia Intensiva) em estado gravíssimo.
Ainda conforme o registro policial, a vítima teve o sistema respiratório bastante atingido pelo fogo.
A amiga da travesti ainda disse em depoimento que a vítima já tinha problemas na justiça com a suposta mandante do crime. Porém, revelou que não sabe a motivação para a tentativa de assassinato, mencionando as provocações ocorridas na boate.
Dupla estava dormindo quando recebeu voz de prisão
Ouvido na delegacia, um dos investigadores que estava de plantão na madrugada de segunda-feira (20) disse que uma equipe foi até o endereço das travestis suspeitas de cometer o crime.
Ao chegar no local, a equipe chamou pelos moradores e uma mulher os recepcionou – a princípio identificada como suposta mandante do crime pela vítima. Logo, a mulher indicou onde a dupla estava dormindo no imóvel. Assim, os policiais acordaram e levaram as duas para a delegacia. Na unidade, realizaram a prisão em flagrante.
Suposta mandante nega envolvimento com o crime
A suposta mandante foi ouvida na condição de testemunha. À polícia, ela contou que é dona de um pensionato no bairro Amambaí, onde uma das suspeitas mora há seis meses. Já a outra travesti, de 22 anos, reside no imóvel há cerca de duas semanas.
Na delegacia, ela alegou que por volta das 9 horas da manhã de domingo (19) a dupla chegou ao pensionato alterada e aparentando estar sob efeito de drogas. Na ocasião, a dupla dizia que tinha brigado na boate e ateado fogo na travesti. Logo, a proprietária do pensionato teria dito: “bonito, né, agora vem a polícia e prende vocês’, segundo o registro policial.
Depois, já durante a madrugada, a Polícia Civil esteve no imóvel a procura das três. Logo, a proprietária falou que soube do estado de saúde da vítima. Afirmou ainda que outra travesti havia ligado para ela lhe dizendo que uma outra pessoa afirmou que ela seria mandante do crime.
Porém, a mulher negou qualquer envolvimento com a tentativa de homicídio, alegando que não saiu de casa e nem conversou com a dupla.
A mulher ainda disse que há cerca de seis anos teve um desentendimento entre ela e outra travesti, sendo que a vítima entrou no meio da briga. Na época, um boletim de ocorrência chegou a ser registrado. Depois, ela alega que não teve mais contato com a vítima e a situação foi resolvida.
Por fim, a mulher relatou que as travestis fazem referência a ela como cafetina, mas alegou que ela é apenas proprietária do pensionato.