Saindo do elevador do Shopping Pantanal de Cuiabá, nesta segunda-feira (14), dona Augusta Cavalcanti caminha entre as fotos de 12 mulheres que ela desconhece a história. A aposentada, enlutada há menos de 6 meses pela morte da filha que perdeu a luta contra o câncer, imaginou que a ação fosse algo relacionado à doença.
“Eu pensei que era uma mostra sobre o câncer, por ter data de falecimento, e porque de longe eu jurava que conhecia algumas dessas mulheres. Nem sei o que pensar, agora que vejo que essas mulheres, diferente da minha filha não tiveram chance de luta”, conta.
As fotos da 1ª Mostra Fotográfica das Vítimas do Feminicídio em Cuiabá, estão expostas no hall do Pantanal Shopping. Um evento da Secretaria Municipal da Mulher e Núcleo de Apoio, Virada Feminina Nacional, Promotorias de Justiça de Cuiabá, Ministério Público do Estado de Mato Grosso e Espaço Caliandra.
As 12 mulheres que compõem a mostra foram vítimas de feminicídio, e os nomes de seus algozes, representam uma tentativa de comunicar com outras pessoas a urgência de combate ao feminicídio e necessidade de gerar uma reflexão.
De acordo com a procuradora de Justiça, Elisamara Sigles Vodonós Portela, essa é a voz e a energia de mulheres que já se foram, mas que permanecem entre nós.
“Muitas vezes, a mulher não tem facilidade de se reconhecer como vítima de violência. Por isso, eu acho importante buscar informação. E a mostra veio despertar essa busca por informação. Eu espero que isso toque outras pessoas, que essa mostra ecoe no coração delas, e gere uma reflexão, para que as mulheres saiam dos relacionamentos enquanto há tempo”.
Para os organizadores, o espaço de interação de um shopping é perfeito, assim todos que transitam podem ter a oportunidade de conhecer e se sensibilizar com a história dessas mulheres.
“Esse ano especificamente, nós do Shopping Pantanal, estamos com uma série de ações conjuntas ao Ministério Público abrindo portas, falando desse tema e de tantos outros. A porta continua aberta. Não gostaríamos de fazer uma exposição como esta. Mas é necessário, e estamos junto nesta luta”, afirma o superintendente, César Augusto Nunes de Moraes.
Futuro roubado
“Eu jurava que conhecia essa moça. O rosto me parece familiar. E é triste saber que existe essa tristeza de crime sendo cometido. Até imaginei que fossem mulheres de outros estados, não daqui de Cuiabá”, comenta Dona Augusta.
Ela, assim com milhares de pessoas, imaginam que o feminicídio é algo distante, mas os rostos, as lembranças, e as histórias evidenciam que a história é mais familiar e, muitas vezes, acontece com quem mais se ama.
É por esse motivo que a mostra percorrerá os órgãos públicos e entidades de Cuiabá, para mostrar que a violência contra as mulheres é um chamado urgente para a conscientização.
“Esta exposição, não apenas homenageia mulheres que tiveram suas vidas brutalmente interrompidas, mas também é uma convocação à reflexão sobre o papel que podemos desempenhar na construção de uma sociedade mais justa e segura”, afirma a titular da Secretaria Municipal da Mulher e presidente da Virada Feminina de MT, Cely Almeida.
Por esse motivo, o espaço Caliandra do MPMT, presente no evento de inauguração da mostra, que segue até dia 31 de outubro, ressalta a importância dessas estratégias de enfrentamento.
“O autor da violência, o feminicida, é preso, foge ou comete suicídio. Aí ficam as crianças sem mãe e sem pai. A mostra é uma forma de fazer o enfrentamento da violência que, infelizmente, em Mato Grosso é alta. Por isso, nomeamos as vítimas e os agressores”, ressalta Vastir Maciel, psicóloga do Caliandra.
Gratuitamente as fotografias estarão percorrendo espaços públicos para que todas as pessoas, inclusive familiares de mulheres que podem ser vítimas de violência, possam se atentar aos sinais e denunciar.
“E aqui, na mostra, essas vítimas voltam ‘a falar’ novamente. Não só no Tribunal do Júri, por meio de um promotor de Justiça ou uma promotora de Justiça. Ela volta a falar novamente com a sociedade. É o espírito delas, a energia que elas emanavam, e tudo isso volta a fluir em prol de uma reflexão sobre a vida das mulheres” finaliza a procuradora Elisamara.
Dona Augusta, silenciosamente, encara mais rostos e histórias, ainda incrédula por tudo que elas poderiam ser ou fazer, e não puderam. “É triste e dói”, disse.
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